“Essa tem sido a rotina do casal Geraldy: Os dois mal se falam, se afundam no trabalho como se estivessem à beira da falência. Acabaram aqueles velhos tempos, onde todas as quintas eu ia tomar um belo chá de comadre com a Rosa, rir dos defeitos dos nossos maridos malucos, das artes dos nossos filhotes eternamente mais lindos do mundo... Jogar muito papo fora a tarde toda...
Agora, eu me esforço pra não ligar toda hora pra saber como ela está. Se já tomou os remédios, se brigou com Claude... Tento não me preocupar... me familiarizei demais com eles, não tem como não me perguntar se esta tudo bem por lá...
Depois de dois anos do sumiço da Louise, a Rosa continua como se ainda estivesse vivendo naquela segunda... Roberta, eu queria que você estivesse aqui, pelo menos você sempre sabia o que fazer pra acalmar a Rosa...
Apesar de ter minhas duvidas, tenho esperanças de que eles voltem a ser felizes como o casal mais lindo e apaixonado que eles sempre foram...”
(...)
“Meu cabelo está crescendo de novo... Faz tempo que eles não tocavam meus ombros... A verdade é que sempre gostei deles cumpridos...
Mais em mais um dos meus ataques, eu mesma me encarreguei de dar fim neles, com a tesoura pontuda que nunca deixei Louise tocar... Agora eles não estão mais parecendo masculinos, tem forma e já tocam meus ombros...
Pro Claude era como se meus cabelos fossem um ente que reclamasse por si mesmo, ele o amava como se o meu cabelo lhe pudesse corresponder... É deveras estranho, mais era como se ele tivesse alma pro Claude... Cortá-lo foi uma forma de me vingar dele, em mais um dos nossos jogos de culpa. Não sei se me arrependo...
Sei que o aborreci, ao mesmo tempo que me feri... me pergunto como estamos... Não me recuperei e acho que não vou me recuperar amanhã... Não quero esquecer... Não posso esquecer...”
Grossas lágrimas escorriam pelas bochechas de Rosa, que mantinha o queixo junto ao peito, escorada no balcão da cozinha sobre suas palmas das mãos. Observava as verduras que estava cortando pro jantar, coisa que há muito não fazia... Se sentia confusa...
Em sua última briga com Claude, a palavra “Divórcio” fora o assunto principal.
Apesar disso... Ela não sabia se era o que realmente queria... Na verdade, traía a si mesma, quando olhava esperançosa para a porta, esperando que se abrisse e uma figura barbuda e engravatada entrasse...
Ela lhe pularia no pescoço, mas não como certo dia fez, e esbofeteou-lhe. Ela o beijaria. O beijaria como nunca. Por que apesar da mágoa mutua em que os dois se encontravam, o amor verdadeiro ainda existia.
Inexplicavelmente o que parecia um casamento à míngua, ainda era repleto de um amor incondicional. Um não saberia o que fazer sem o outro.
Era a certeza que os dois pensavam enquanto contraditoriamente seus lábios proferiam
“Divórcio”
(...)
“Estou a beira de um colapso, tenho certeza!” Claude pensava enquanto virava o frasco prateado na boca, seus olhos estavam vermelhos, afrouxara a gravata assim que se viu só no elevador.
Entra no carro tendo em mente que o último lugar pra onde ele iria era seu lar. “Lar... O que é isso?...”- mais um grande gole de whisky
“Non sei e tenho raiva de quem sabe.”
Dirige até lugar nenhum. Acredita estar perto de seu prédio. Não ter certeza. E nem quer ter certeza. Tudo o que quer é acreditar que está do outro lado do planeta.
“-Divórcio... Divórcio hã?....” Estaciona o carro na vaga ao lado do carro de Rosa- “ Mon Dieu!!!”- Ele estava uma pilha de nervos. Bate a cabeça contra o volante, como se ainda ouvisse vozes ecoarem em sua mente:
“Claude rapaz! Você precisa se conter! Precisa ser forte e ajudar tua esposa a superar! Não estou dizendo que você precise esquecer, só... Superar! Seguir em frente... Procurar claro, sempre! Esperança! Vocês precisam viver, amigo! Viver! Não sobreviver como tem sido!- Pro inferno de barquinho Frason..
.- Não! Não! Só pelo prazer de dizer ‘Aqui quem manda sou eu, é?! Você acha que tem direito de me dar ordens?! Mas saiba... saiba que você não pode!!! Você não pode! Não pode... mandar em mim!!!- ainda sente dor na palma da mão ferida pelo vaso que Rosa lhe lançara com pudor.
“Non consigo entender, Chérie... Eu só... Te amo!...”
Ele decide entrar logo que constata que sua garrafinha não se encheria sozinha. Em sua adega havia o perfeito remédio para aquela dor de cabeça: uma destilada bem mais forte que essa que bebera.
Não sabe se é a enxaqueca... Ou por que chorara como um bebê... Só que a dor de cabeça que levava com sigo, era realmente desorientadora. Passa pelas soleiras da porta pressionando os olhos com os dedos.
A claridade parecia querer cegá-lo.
Não se lembrara nem de sua pasta... Esta, jazia em algum lugar... “No porta-malas?” Não lembrava.
Sequer lembrava de que precisava de cura e não de dor. Seria mesmo melhor o amanhã? O tempo poderia desfazer o que no passado se fez? Não.
Seja como for, o fato mais embriagador era que na hipótese de Louise estar viva por ai...
Ela crescia longe dos olhos do pai coruja que a amava demais. Que daria tudo o que tem, só pelo prazer de vê-la sorrir outra vez.
Durante esses dois ano a vida que ele sonhara com Rosa foi aos poucos desaparecendo como um sonho bom quando se acorda. No começo, os dois se apoiavam, se davam forças. Porém com o gênio explosivo dos dois de combustível, a tensão tornou a rotina cada vez mais imprevisível.
As variações de humor de ambos nunca se coincidiam. Então, começaram a brigar quase diariamente. A procura pela culpa foi inevitável, assim como as lágrimas. Rosa tinha se envolto outra vez numa casca. De onde não pretendia sair tão cedo.
Claude voltara a seus velhos ataques de mal humor.
Ambos tomaram o trabalho como ocupação principal. Dividiram a presidência em setores, e cada um tinha sua parte. Assim, não teriam que dividir uma mesma tarefa evitando conflitos dentro da empresa.
Esta tinha se tornado um verdadeiro império, fruto do empenho exagerado de seus presidentes. Quem visse, diria que eram felizes por ter conseguido triplicar suas dimensões.
A verdade o casal sabia, isso não era nada que pudesse ao menos ocupar um pequeno espaço no vazio de seus corações.
Muitos invejosos os cercaram por todos os lados. Inclusive dentro da empresa. Estes se encarregavam de implantar mais motivos de discussões entre o casal, inclusive dando ideias de vendas de ações e de divórcios...
Em ambos os lados, se ouvia:
“Não... Isso não pode continuar... É perda de tempo... Quando não dá mais certo, não dá! Não funciona mais, então, o melhor pra vocês dois é seguir cada um pra seu lado...”
Não era conselho de quem tinha boas intenções, claro. Mas por vezes os dois pensavam a respeito com cautela.
Estavam desesperados por paz. Sabiam que só teriam se encontrasse Louise. Mesmo que... Bem isso não era animador....
Porém em memória da pequena eles as vezes se perguntavam se não podiam lhe mandar flores. Mais não. Não havia jeito.
O quarto dela estava lá. Intacto. Ainda sim, as botinhas vermelhas estavam bem lustradas, sobre os aparadores da cabeceira. Uma de cada lado.
(...)
Claude é recebido pelo olhar cansado de Rosa. Que não consegue esconder que “sim, seu coração saltara em vê-lo”. Com cuidado, ele lhe beija a testa.
E assim seguem num jantar silencioso. Até que Claude pousa os olhos sobre a mão estendida na mesa. Observa sua aliança no dedo. Observa o prato quase vazio, toda a refeição fora mastigada lentamente, criava coragem para terminar a noite.
Leva o olhar até a mão de Rosa, que repetia sua postura:
C- Rosa. Non quero o divórcio. – Ele disse num tom calmo e convicto.
Rosa levanta a cabeça encarando-o com os olhos marejados;
R- Eu também não. – Os dois se forçam a sorrir. Enquanto as lágrimas lhes brotam nos olhos agora iluminados de alegria.
Os dois imediatamente se abraçam. Rosa num impulso se sustenta no lombo do francês, que agora a beija e a leva da cozinha pra junto das escadas, a pega no colo, fazendo-a lembrar da lua-de-mel que era sua vida à exatos dois anos atrás.
(...)
C- Tudo o que agente precisa é desejar.... Desejar com tudo o que há em nós, amor. Pra que ela volte pra casa sã e salva... Non podemos nos dar por vencidos e deixar nossas vidas se destruírem assim. Eu te amo. É muito importante que tanto eu como você tenhamos consciência disso. Non quero estragar tudo...-
Claude dizia baixinho, apesar de ver que Rosa adormecera, ainda sim acreditava que ela o pudesse escutar. Sorri ao acariciar-lhe o cabelo que crescia novamente.
Se levanta e decide que precisa de um banho gelado. No qual Rosa acaba por surpreendê-lo entrando ainda vestida com sua camisa debaixo da água gelada. Ela lhe abraça pelas costas.
Ela não tinha certeza se no meio da água do chuveiro, não lhe escorriam também lágrimas no rosto. Não lágrimas de tristeza. Mais de ternura e muita esperança.
R- Estamos juntos nessa de novo, meu amor!
(...)
Rosa entra no carro. O dia é cinzento e úmido. A pista está enlamaçada e o trânsito apesar não estar lento, ainda é caótico.
“A maior concentração de bocas sujas por M²!” pensa Rosa.
Aquela hora era mesmo de correria, inicio de fim de tarde, a tensão e ansiedade estava na face de todos os motoristas.O farol fecha. Rosa apoia um cotovelo na porta do carro. Suspira. Olha para a rua...
Arregala os olhos de surpresa...
Seria ilusão de ótica? Aquela pessoa de cadeira de rodas...
Ela conhecia?... “Meu Deus!... Não... Será possível?!”...
Nenhum comentário:
Postar um comentário