segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Capitulo 8- O Pedido


 
Le Eternel Amour
Tulipe Rouge

Me sentei num banco, e fechei os olhos por um momento. Queria tentar meditar um pouco, mas Tony não demorou a aparecer. Nos abraçamos e começamos a andar pelo gramado, o fraco sol brilhava, mas não aquecia o quanto era de se esperar.

- Rosa, você de branco?- ele ri, lembrando de que minhas roupas sempre foram de cores fortes.


-É... Branco. E sabe, eu vim de branco hoje porque me lembrei daquele dia, mais precisamente aquela tarde que você não foi se despedir de mim, nas férias de verão.

- A rosa branca?

- Oui, e hoje, eu sou a Rosa de branco!- rio

- Non me perguntou o que significava non é?

- Não. Eu acabei deixando pra lá.

- Mas você sabe que naquela ocasion, eu reinventei o significado de se dar uma rosa branca?

- Hum, é mesmo?

- É. Rosa branca é paz, amizade, esperança, ou simplesmente, ignorância ao amor, coração que non ama, essas coisas. Mas eu reinventei. O que eu quis dizer era que simplesmente você era “Rosa”. Non importando a cor, ou o significado. Você poderia escolher a cor que quisesse praquela flor, ou simplesmente, pintar cada pétala de uma cor.- ele sorri

- É, acho que isso sim seria uma boa idéia! Afinal, para quê escolher quando se pode ter todas as cores numa flor só?!- eu rio.

- Sim, e todos os significados também.- ele fica sério.

- Significados... Tudo tem né? Significado... - eu viajo pelas crianças que brincam no parque- Acho que tudo deveria ser revelado de uma vez. Nada de “significado oculto”!

- É. Eu concordo com você.


- Ah concorda? –ele acena com a cabeça.- Não é o que parece. Você sempre esconde as coisas de mim. Eu sempre te contei tudo, mas você não me dizia nada sobre você.

- Eu preferia te ouvir.

- Mas eu também gostaria de ouvir você!

- Me perdoe Rosa, mas acontece que eu non poderia agüentar nem mesmo dizer o que se passa na minha vida.

- E o que é? Eu poderia ter te ajudado!

- Non, você non poderia fazer nada. Apenas... Me veria com outros olhos e nossa amizade estaria acabada.

- Mas como, com “outros olhos”?

- Simplesmente, diria: “pobre do Jean, ton problemático, tadinho!” Eu non suportaria ser visto como sei lá, vitima, coitadinho, ser visto com pena, non! Isso nunca!

- Mas do quê você está falando afinal?!- ergo os ombros, questionando irritada.

- Esqueça Rosa! – ele fecha os olhos, com raiva.

Notei a irritação dele, então decidi me calar. Mas depois de um pouco de silêncio, decidi perguntar:

- Por onde você andou nesses dois anos?

- Com meu pai.

-e seus sonhos? Suas vontades? Onde foram?

- Eu nunca nem tive sonhos, Belina. Apenas vontades passageiras.

- Por que? Por que você não se permitiu sonhar?

- Porque non. Eu vou ajudar meu pai e está de bom tamanho.

- Como de bom tamanho? Você é inteligente, Jean, carismático! Não consigo engolir que não tenha sonhos!

- Queria ter, Rosa. Eu queria mesmo. Mas simplesmente non consigo.

- O anjo da cafeteria.

- Hã?- Nós dois sentamos embaixo de uma árvore.

- Da Suzanne Selfors. Um livro que conta a história duma menina que queria ter um algo a mais em sua vida. Um hobie, um... Uma coisa em que ela realmente fosse boa. Então, um belo dia, ela vê o que parecia ser um mendigo dormindo no chão, na entrada dos fundos da cafeteria de sua avó. Ela sente pena dele e sem que ele veja, lhe dá café, bolos e chocolate. Ela não sabia que ele era um anjo e que por ela ter o ajudado sem interesse, ele iria dar a ela aquilo que ela mais quisesse no mundo. Mas era realmente complicado pro anjo concluir essa “missão”, já que ela não sabia o que ela mais queria.

- Uau...- ele balança a cabeça- Você defnitivamente se tornou uma intelectual.

- Estou na ala critica do jornal.- dou os ombros- Acho que está me enganando. Você não se parece com a garota do livro.

- Com certeza non!- ele ri, meneando a cabeça

- Ela procurava hobies, e não alcançava êxtase em nada. Mas você é o contrario. Me diz... uma única coisa que você tenha tentado fazer e não tenha conseguido?- eu questiono,  me lembrando de que o Tony parecia ser  capaz de fazer  qualquer coisa. Seja esportes, seja falar novas línguas, tocar os mais variados instrumentos. 
Ele cantava. Ele dançava maravilhosamente bem. Ele tocava mais de cinco instrumentos até onde sei, e além de tudo, praticava qualquer esporte que se propusesse a ele.

Mas ele suspira, abaixando a cabeça.
- Se você soubesse...- ele tira uma garrafa do bolso do blazer, começa a beber.

- O que é isso?

- Água.

- Tony, desculpa mas... Desde a hora que chegamos você não para de tomar água. Nunca foi de beber tanta agua assim, até onde me lembro.- pergunto, desconfiada.

-Mas qual o problema? É só água!

- Me dá um pouco?- estendo a mão, e ele me entrega a garrafinha. E bebo. Água. Decepciono-me.

- Algum problema?

- Tem!- eu fecho a garrafa. – Uma pergunta!

- Faça.- ele dá os ombros, franzindo a testa.

- Tony, por acaso você está usando drogas?!- eu pergunto, como se a pergunta não fosse tão dramática.

- Como?!- Tony estreita os olhos, se inclinando a fim de me ouvir melhor.

- Você ouviu. Está usando drogas? Por que começo a pensar que está!

- Rosa, eu só estou bebendo água!- me aponta a garrafa- Você não viu? Água!

- Bebendo água como um usuário de êxtase! Você esta bebendo água sem parar a duas horas!

- Mas o que tem demais? Isso me taxa como viciado?!

- Jean! O que quer que eu pense? Você não pode estar contando tudo! Você está me escondendo detalhes eu sei!

- Por que?! Por que eu non posso simplesmente non querer me apegar a nada?! Hã?! Me responde!

- Não...- eu escondo o rosto nas mãos, me inclinando pra trás- Não se trata só disso! Eu quero saber de você! O que acha de tudo! O que, por que você não enfrenta seu pai, pelos seus ideais, seus...

- Já disse! Non tenho sonhos! E é só!

Eu suspiro, me jogo na grama.

- Sem sonhos de que vale a vida?- falo, em um tom tão baixo que penso que ele nem ouviu.

- De nada, Bel. – ele responde, se deitando ao meu lado- Non vale nada. Mas e quando...
Ele se cala e não completa a pergunta.

- Quando?... Vai, completa!-eu o encaro.


- Hum... Non, deixa pra lá.

- Espera! Tive uma idéia!- eu me sustento nos cotovelos, e pouso a cabeça no peito dele.

- ei, o que está fazendo?!- ele pergunta, tocando meu ombro.

- assim vão pensar que somos namorados!- digo, ainda imóvel.

- Mas o que você está fazendo?

- Tentando ouvir o seu coração! Talvez ele me diga alguma coisa!- eu o encaro- Me dê uma dica do que você mais deseja no mundo!

Ficamos alguns segundos, nos olhando, em silencio, até que ele diz:

- Por acaso você é o anjo da pizzaria?

- Pizzaria?! – eu bato com meu punho em seu peito

- Restouronte italiano.

- Restaurante.- O corrijo, rindo

- Restoronte.

- Ta! resTaurante!

-  Ah! Não consigo!- ele fecha os olhos, virando o rosto.

- Ei! Você disse não!

- Hã?- ele me encara

- É! Não! Você disse não!

- Como?

- Sei lá! Mas você disse: nã-um. Não!

- Nossa nem percebi.- ele me encara, e ficamos novamente em silêncio.

- Vou tentar; hã... Res- tón... Non, droga! Espera! Res- ta- u- rón…

- Não! Taurãã

-hã… Deixa, eu desisto!

Eu coloco o ouvido em seu peito novamente
- Deixa eu ver... Tu-tu. Tu-tu. Tu-tu...- rio

- Tutu? Non é comida brasileira ?

- Hum...- ignoro-o- Tu-tu...

- Non gosto de tutu.

- Correr... tocar sax... chocolate... teatro... não... nada de Shakspeare.... hum...

- Ah, mas tudo isso você já sabe!

Eu o encaro
- É. Mas descobri outra coisa.

- E o que foi?

Suspiro, e volto a encará-lo

- Que seu coração bate rápido demais.- ele engole em seco.- Ou será apenas sua “reação” a minha proximidade  a você...-  brinco com a gola de sua camisa
- Rosa...

- Vai negar?- o olho séria.

- Eu non posso...

- Não pode oque?

- Ficar. Non posso ficar aqui com você, Rosa, tenho que voltar, preciso encontrar meu pai daqui a duas horas.

- Duas horas. Agora me responde.

- Responder o que?

- Se você ignora o fato de nós dois sermos ligados um ao outro... de forma especial.- olho profundamente em seus olhos, mas ele foge

- Rosa, eu non te mereço, non posso te fazer feliz, entende...- ele se senta.

- Por que não? Como é que você pode saber? Eu acho que já sei qual é o seu problema!

Ele suspira, olhando pro outro lado
- E qual seria?

- Você é um medroso! Sempre foge! Se esconde! Mas porque Tony, me diga porque?! Você é lindo! Por dentro, principalmente! Você, faz as pessoas rirem, você... ajuda a todos que pode, você... é o meu conde Fersen! Você! Você!

- Non... Eu não sou...

Eu abaixo a cabeça.
- Eu vou me casar, Jean. A menos que você me dê um bom motivo pra desistir, talvez eu vá estragar toda minha vida ao lado de uma pessoa que não é o meu anjo.

- E quem é?

- Você não conhece. Mas ele te conhece. Ele mora... Aqui...- toco com o indicador o peito dele- Pena que esteja sufocado, meu pobre anjo. Se ele sair, por favor, peça a ele que vá até Paris, precisamente ao Formaggio nel piato me buscar, e que me leve com ele por onde quer que ele vá.

Tony abaixa a cabeça, e eu cantarolo

- Fly me to the moon, and Let me play, among the stars...

- Non posso te levar a júpiter ou a marte comigo, Bel… Sinto muito. - ele me olha triste.

- Vai me proteger do vento e dos tigres?

- Você tem mais do que três espinhos pra se defender. - ele se levanta, beijando minha testa.

- E você não é louro e nem pequeno, meu príncipe. Mas os vulcões estão à explodir.

- Rezarei pra que caiam rolhas enormes dos céus.- ele pega o blazer, e suspira, me olhando.

- O Julio não vai saber defender-me da saudade.

- Eu também não saberei. – ele vai embora, e eu fico tentando achar uma explicação pra o que ele me disse.

domingo, 27 de fevereiro de 2011

Capitulo 7- Of London



Le Eternel Amour
Tulipe Rouge

Eu e Sérgio deixamos o Perrault, voltamos à Paris sem olhar pra trás (bem, não exatamente, já que Sérgio achava a Rússia tão longe e tão fria para a Jane ir pra lá).

Ambos passamos na Oxford, iríamos pra Inglaterra na semana seguinte.
Eu me pendurava por horas ao telefone, falando com Janete sobre quão ansiosa eu estava e o quão triste pela distancia que nos separaria. A Jane estava decidida a estudar medicina em Moscou. Eu então acabei escolhendo jornalismo, o Sérgio quis fazer engenharia mecânica.

- Jane, hoje esse restaurante tá um tééédio!- eu rio, revirando os olhos- Não. Amanhã eu acho que vou comprar umas botas novas... pois é. Rsrsr, - eu me encostei na parede, de costas pra recepção.
 Ouvia os dedos do Sérgio tamborilar na mesa do caixa, ao meu lado. De repente ele para

- Bel...- ele me chama

- Espera ai, amiga,- abafo o telefone no peito- oi Sérgio, oque foi? Cliente?

- Não.- ele responde, olhando fixamente pra entrada. Eu me inclino e olho pra porta – provavelmente não! Jean!!!- ele se levanta, dando a volta no caixa.

- Bom jour!- Tony responde, apertando a mão do Sérgio, os dois se abraçam pelos ombros

- Cara, cheguei a achar que nunca mais iria te ver, amigo!

- Ah mas oque que é isso... Jamais deixaria meus amigos!- ele diz num sorriso que me faz amolecer o coração

- Tony....- eu finalmente digo, e ele me encara

- Olá, Rosa! – ele dá um passo pra trás. Eu dou a volta no balcão rapidamente e me jogo no abraço dele

- Tony! Por onde você andou?! Eu estava ficando preocupada!- digo, o apertando tanto que sinto suas costelas.

- Eu tive que resolver uns problemas, mas estou aqui agora, hã? São e salvo!- ele me encara sorrindo.

- Hum... –eu me afasto- Porque você fez aquilo?- pergunto séria

- Aquilo que?- ele franze a testa

- Tony, você mandou seu irmão no seu lugar no baile de formatura! Você esqueceu foi?

- Non Rosa...- ele me puxa pela mão, olha pra Sérgio- Bem, o que acha de agente dar um passeio? A
neve está quase imperceptível... nós podemos ir a um parque, o que acha? Assim eu te explico tudo.

- Tá... Então...- eu olho Sérgio, que me dá os ombros-  me espera que eu vou colocar o casaco!

- Tudo bem.- ele sorri. Eu tiro o avental e subo as escadas correndo, esbarrando com Joana ao chegar no piso superior(no caso, o hall de entrada da minha casa/o apartamento)

- Ei! Qual o por quoi dessa pressa toda, posso saber?- Ela sorri, desconfiada


- Depois explico!- eu apenas aceno com a mão, subindo os últimos degraus.

Abro a porta furiosamente e pego meu casaco do gancho. Ia saindo novamente mas lembro dos meus sapatos (estava de tênis, na neve, sem chance!). Abro o armário da sala e pego um par de botas de couro. As calço desajeitadamente e desço correndo.
Tony estava sentado numa mesa, Joana de pé frente a ele. Ela se vira pra mim sorrindo

- Nossa como o Tony está mudado, não Rosa?

- Pois é...- respondo, analisando meu amigo que falta se esconder de baixo da mesa tamanha vergonha.
Ele parecia mais... Corado...

- Foi as férias no litoral... Passei apenas uns dias por lá e me já apaixonei pelo lugar.

- Duvido que seja como o sol do Brasil... mas o sol de lá com certeza te fez mesmo muito bem!

- Bem, vamos?- eu aceno pra que ele me siga

- Vamos, vamos sim.- ele se levanta

- Ué, pra onde você vai Belina?- Joana pergunta

- Eu vou no parque aqui perto, pra conversar um pouco com o Tony...

- Mas porque não conversam aqui mesmo? Com esse frio que está lá fora! Paris não tem aquecedor esterno não ein?

- Ah Joana nem está tão frio assim!- eu protesto enquanto ela enfia uma touca na minha cabeça

- Ah não é? Isso porque você ainda não saiu nem na porta hoje! Agora vai antes que seu pai chegue, e aliás, não demore por que mais tarde teremos movimento!- ela me estende um par de luvas de couro marrom

- Movimento? Mas como? Estamos às moscas faz uma semana!- falo, calçando as luvas e andando em direção à porta, onde Tony esperava.

- Acabei de “fechar a noite” hoje, pro pessoal do salão que eu freqüento, sabe? É aniversário de casamento dos donos e eles vão fazer a comemoração aqui...
Eu fecho a porta de vidro e aceno, já do lado de fora.
Sinto o vento gelado e me encolho.

- É... dona Joana tem razon, esta um frio danado aqui fora!- Tony diz, olhando pra rua, que estava praticamente deserta.

- Pelo menos parou de nevar.- digo, estendendo a palma da mão como que pra verificar o tempo.

- Daqui a pouco teremos até flores, non?- ele ri, apontando o que deveria ser uma samambaia(estava coberta de neve, parecia apenas galhos secos)

- E pássaros, e borboletas, e... gansos, e... ah, as pombas não somem nunca!- rio, dando saltinhos, na tentativa de me aquecer.

- Ah, non podemos esquecer do unicórnios, hã?- ele me abraça pelos ombros, e nós entramos num café.

- Então... Você não pode ir pro baile porque seu pai foi internado?

- Oui.- ele responde, mexendo o café.

- Eu não acredito.- eu falo, cruzando os braços.

- E porque non?

- Porque se o seu pai foi internado, porque o Claude não foi também ficar com ele no hospital?

- Rosa... o meu pai e o Claude non se dón bem, você sabe...

- Tony mas mesmo numa situação dessas? Poxa! Eu não entendo!

- O Claude não ia poder se afastar tanto do campo de treinamento da aeronáutica, e além do mais, eu estava mesmo com as passagens já reservadas.

- Reservadas? Pro meio da noite?

- É. Mas isso non é novidade, você sabia que eu iria voltar pro norte antes de todos.

- Eu sei mais... -eu o olho por baixo, aflita- aiii Tony eu não quero que você suma assim!

- Que eu saiba a senhorita vai pra Londres na terça non?

- É. Mas hoje ainda é quinta, temos alguns dias pela frente, por que você não fica na minha casa até eu ir? Por favor?!

- Non Rosa! Mas que idéia! De jeito nenhum, eu non posso ficar em Paris até terça. Meu pai e eu estamos aqui só pra ele fazer uns exames e vamos voltar amanhã!

- Amanhã?! Mas tão rápido!

- Meu pai precisa de ar fresco, Rosa, e o litoral é ótimo pra ele.

- Você... não vai fazer faculdade? Se formar?
Ele suspira

- Non sei... Non sei, existem muitas... Coisas mais importantes por agora... Mas se até ano que vem tudo se... resolver... ai sim, eu  vou pra Oxford também.

- Você quer ir pra Oxford?! -Eu sorrio, animada

- Oui. Mas non sei ainda. Tudo depende...

-Do seu pai?

- Mais ou menos isso... Mas non importa, ficarei torcendo por você!- ele pega minha mão

- Eu também. Por você!- rio.

- Merci!- Levanta a xícara, como que oferecendo um brinde.

Depois desse dia, passei uns dois anos sem ver o Tony. Eu e o Sérgio nos empenhamos em nossos estudos, afim de não dar trela pra saudade que agente sentia da nossa casa, dos nossos amigos...
Bem, eu estava me preparando pra começar meu primeiro dia no estágio(num jornal de Londres) e esperava o ônibus (bonde) me abraçando (estava ventando muito) e pensando que Londres se parecia mais com Paris do que eu poderia imaginar.

O bonde vem e eu subo nele, mas minha saia se engancha num banco (neste dia eu estava tão nervosa e desastrada como azarada)

- Aiii droga! – eu resmungo, puxando a saia nervosamente. A senhora que estava precisamente no banco “desgramado” me olhava de testa franzida. Eu puxo com mais força ainda e a saia solta, eu sorrio para a senhora, que agora arregalara os olhos. Estou tão nervosa que sento no banco sem nem ver quem estava do lado.

- Mais cuidado, senhorita. Poderia ter rasgado sua roupa.- a voz diz, e eu demoro uns segundos pra me tocar de que primeiro, o idioma usado foi o português ao invés do inglês, e aquele sotaque...

- A...- eu fico perplexa, ao olhar para o....

- Sou eu, Tony!- diz, brincalhão

- Ah! Tony!- eu o abraço.- meu Deus! Que saudade!

- Eu também senti, hã?

- Me conta! Me conta tudo!- eu sorrio, me ajeitando no banco de forma a poder encará-lo.

- Mas contar o que?

- Tudo, Jean Antoine, tudo!

- hã...

- Começa por como você veio parar aqui! Não, melhor, quando você veio pra cá e quanto tempo vai ficar!

- Calminha ai, hã?! Nossa! Você está muito agitada! Parece até um furacón!- ele ri, provavelmente se referia também ao fato de eu estar multicolorida.

- Vai, não enrola, conta!- eu aperto a bolsa num gesto acusador à minha ansiosidade.

-Olha, acho que é muito pra eu te contar agora...- ele diz, olhando a rua.

-Muito?- eu levanto uma sombracelha

- Longa história.- ele acena com a cabeça.

-Hã... Então, faz assim, que tal agente se encontrar pra conversar? Preciso mesmo te contar umas coisas. - eu olho profundamente em seus olhos.

- Hum, acho ótimo!- Ele sorri

Nós combinamos de nos encontrar no outro dia, num parque verde que eu amava em Londres.
Eu estava muito agitada mesmo, mas não só pelo estagio, e não só por ter encontrado o Tony.
Eu estava prestes a tomar uma decisão.
 Uma decisão que daria uma nova direção à minha vida.E o que eu esperava desse encontro era muito mais do que apenas pôr o papo em dia com o Tony. 
Eu esperava que esse encontro me desse a certeza sobre qual era a decisão certa.
 E tudo poderia acontecer....

-


quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

CapituCapitulo 6- “O usurpador”?

Le Eternel Amour
Tulipe Rouge


Mesmo depois do episódio do nariz fraturado, o Tony não deixou suas corridas de lado. Mas outra coisa que não se separaria dele era “eu”, que comecei a fielmente segui-lo. No começo, ele ignorou meu ritmo e não se importava se eu estava me matando pra tentar alcançá-lo. Mas depois que percebeu que eu não iria desistir, começou a me “treinar” em trotes mais amenos e até caminhadas. Aos poucos eu já estava no mesmo treino que ele e assim, nós corríamos lado a lado.

Nesses momentos de corrida agente nem tinha como conversar, primeiro pela falta de fôlego e segundo pela “seriedade” do momento, mas nas horas de descanso sempre falávamos de tudo. Era um tempo a mais pra que agente pudesse “se conhecer”. Preferências, gostos, opiniões... Acho que foi ai que a nossa amizade se fortaleceu ainda mais.






Sentávamos na grama do pátio, ao sol... E às vezes ele levava o saxofone, tocava um pouco...
Me lembrava dos parques de Paris... Cujas praças lotam de pessoas a fim de tomar um pouco de sol, fazer piqueniques, tocar instrumentos...

Uma vez levei meu violino (deixávamos os instrumentos guardados no armário de materiais didáticos, no andar térreo, assim era mais fácil de buscá-los) e comecei a tocar uma melodia doce... Moon River, o Tony adorava o Frank Sinatra (mesmo quando os estudantes do Perrault repudiavam tudo oque diz respeito aos U.S.A) e eu também. Foi meio mágico... Os movimentos do arco... O sol me aquecendo... o Tony com aquele sorriso pensativo me observando... Foi maravilhoso, mas ao final (quando ergui a cabeça e olhei em volta) percebi que ele não era meu único espectador, havia uma roda de pessoas ao meu redor, e sorriam enquanto soavam seus estridentes aplausos.

Mas então, o fim do ano chegou. As temidas provas finais nem se comparavam às angustiantes despedidas que estavam por vir...
Enfim, assinamos os anuários, tiramos fotos com aquele chapéu engraçado (que no final, foram arremessados pro alto), nos entupimos de croisants, rimos à beça.
O baile seria logo mais, à noite, e todos se recolheram pra suas toilettes pré-festança...
 Janete estava tentando entrar no espartilho apertadíssimo de seu vestido de cinderela, enquanto eu estava a ajeitar a peruca loira de Maria Antonieta na cabeça, sem que ela despencasse.

Na hora marcada, eu estava lá, dando até daqui a pouco pro Sérgio e pra Jane, já preocupada por ver Frasão aparecer sozinho nas escadas. Alabá (na ocasião, Storm, dos ex-man) me deu os ombros e tomou o braço do namorado (o lanterna verde), me acenando num sorriso enquanto eu tentava fazer Frasão me dizer onde estava o Tony.
Eu me sentei (com alguma dificuldade, por culpa da saia enorme do vestido) e esperei (impacientemente) pelo meu parceiro. E ele apareceu (?). Não pelas escadas, como era de se esperar, mas ele veio do pátio esterno, e me estendeu a mão, num suspiro (a essa altura, eu provavelmente estava uma Maria Antonieta meio que assustadora; sentada na escada, joelhos separados, cotovelos sobre a saia, cenho franzido, põe descabelada também!). Eu ergo a cabeça e o encaro, estreitando os olhos

- Clau-de?! – eu me levanto com ajuda dele- Oque?!

- Non tem póm, coma brioche! – ele dá os ombros, arqueando as sombracelhas. Eu escancaro a boca, perplexa

- Mais... Cadê o Tony?!- eu falo, enquanto andamos, o analiso dos pés a cabeça- Você... Você nem pode entrar aqui! É só pra alunos, sabia?!

- Bom, ninguém duvidou que eu sou daqui, o porteiro até me deu os parabéns!- ele ri, sarcástico

- Mas isso porque ele deve ter achado que você é o Tony! Mas cadê ele?!

- Bem, o seu Conde Fersen infelizmente non pôde comparecer e me mandou pra substituí-lo e non deixar a senhorita com cara de taxo ai nessa escadaria.

- O que?! Como assim não pode vir? Peraí! É o baile de formatura!- eu empaco, soltando meu braço- Como ele não aparece na própria formatura?! Onde ele está?

- Ah, non me faz perder a paciência, hã?! Estou aqui te fazendo um favor, Maria Antonieta!

- É Rosa! Mas não quero seus serviços de usurpador, obrigado!- eu franzo a testa fazendo reverencia.

- Ah, mas eu non te perguntei!- ele dá os ombros, me puxando pra dentro do salão, que já estava lotado

- Como veio parar aqui?!- eu pergunto, enquanto sorrio pra minha professora de história, que ironicamente esta de Marie Moore.

- Digamos que tive uma infeliz coincidência, vim pro campo de treinamento da cidade visinha, ai meu querido irmon me solicitou.- ele responde no meu ouvido, ainda passamos pela “multidão esmagadora” (no sentido literal)

- O Tony tinha algo mais importante pra fazer do que vir ao próprio baile de formatura?!- Claude apenas dá os ombros

-  A minha foi muito melhor, eu garanto.

- Hum, e eu posso saber o porque?- eu arqueio as sombracelhas, o olhando por baixo e cruzando os braços. Ele umedece os lábios e olha pros lados

- Bom, primeiro, porque não tinha a família Adams, - eu vejo um grupo de nerds abraçados sorrindo prum vampiro que tinha uma câmera fotográfica em mãos- Nem tinha as bailarinas do Moulim Rougue
ali-
 vejo três bailarinas de can can: uma tão magra que some debaixo da roupa, uma gordinha de bochechas vermelhas no meio e a outra usando  enormes  óculos redondos na outra ponta.

- Mas com toda certeza, não tinha um DJ Charada, eu aposto!- eu rio apontando a mesa de som, cujo DJ se balançava pra lá e pra cá, de um jeito divertido.

- Escuta, os seus pais ainda eston aqui?

- Não, eles foram pra a vila de Verrières e amanhã nós voltaremos pra Paris, mas por que a pergunta?-

- Hã... Nada, só achei estranho...- dá os ombros- Bem, deixa pra lá.

- Tá... – eu respondo, olho pro salão, começa a tocar let is snow, remixada com uma eletrônica intercalando
- ei, eu adoro essa música!- começo a puxá-lo pelo braço, mas ele empaca

- Ei! O que está fazendo, hã?!

- Simplesmente o que eu vim fazer nessa festa! Indo dançar!- puxo-o novamente

- a... Non! Non eu non danço!- eu paro e o encaro

- Não dança?! Ah, conta outra! Você é francês ou oque?!- eu finalmente venço, e consigo levá-lo até a pista.

No começo, ele estava todo duro, emburrado. Mas ai eu fui fazendo piadinhas sobre as fantasia inacreditáveis dos meus queridos colegas e ele acabou por se divertindo um pouco também, e até dançou!
O irmão do Tony não é mau, só... Mal humorado... Exatamente o contrário do Tony, que sempre é super de bem com a vida, ri de tudo e se diverte muito. Tá que quando toca no assunto família dele, ai ele sai de perto. Mais nem por isso trata ninguém mal...

A festa já estava acabando, decidimos ir dormir, o outro dia seria tão cansativo como este havia sido.
O Claude estava calado fazia um tempo (genética?)
- Bem, obrigada por ter vindo.- eu digo, sorrindo para a cópia do Tony.
- De nada. Espero te ver outra vez.
- É, acho que vou sobreviver...- rio, mas ele apenas pressiona os lábios
- O Tony mandou pedir mil desculpas, - abaixa a cabeça pra olhar minha peruca, que eu segurava- ele teve que ir antes e...
- Ir? Ir pra onde?
- A... Ele disse apenas isso, hã? Ir.
- Hum....- balanço a cabeça, fazendo bico- é, espero que ele se lembre de mim.
- ele vai lembrar.- ele me sorri, beijando meus dedos e se despedindo.

Onde será que o Tony teve que ir? Ir.
Espero encontrá-lo outra vez. E espero que o Claude sorria mais vezes. Ele tem um sorriso bonito (é, precisamente igual ao do Tony, só que menos intenso, eu diria).

Então, subi as escadas, e me livrei daquele espartilho monstruoso, assim como dos sapatos.
Cai na minha cama (despedida) e fiquei olhando pro teto. Mais que dia estranho! O Tony estava lá, recebendo o tubo, sorrindo pras fotos, e de repente, puf! Ele simplesmente desaparece! E me “envia” o Claude como substituto em seu papel de conde Fersen!

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Capitulo 5- Volta às aulas



Le Eternel Amour
Tulipe Rouge


E voltamos. Voltamos à Verrières, ao Perrault.
Para o nosso tão desejado último semestre. E nessas condições, tanto a sensação de despedida como a de perda estavam no ar. Toda aquela ânsia pelos anuários, pelas cartas com os sonhados: “admitido” vindas das universidades almejadas...
Mas obviamente, a minha maior ânsia era a de receber uma comprida e detalhada explicação do Tony... Ou ainda melhor, uma biografia completa. Mas eu sabia que era quase impossível...

O Tony tinha um humor incrível! Não apenas pelo sorriso fácil mais também pela fases dramáticas. Era incrivelmente dramático quando queria. Apesar de que nessa época, nunca o tinha visto chorar...

Todos reunidos, refeitório lotado, inspetor parado logo atrás da nossa mesa de braços cruzados(talvez se sentisse a autoridade policial do pedaço, quem se importa?)
A não ser os cochichos de Alabá e Frasão, silêncio entre nós.
Fazia uma semana que as aulas haviam voltado e todos já estávamos no velho clima de estudos intensivos... E fazia uma semana que o Tony mal falava. O detalhe é que a meu pedido, ninguém havia tocado no nome do Claude. Pro Jean, agente nem sonhava com a existência do irmão dele. Quero dizer, até onde nós podíamos saber.

- Ah! Chega! Eu não agüento mais!- Janete estoura, depois de minutos em agonia pelo silêncio perturbador. Ela bate as palmas na mesa- Tony, como vai o seu irmão? Na aeronáutica eles podem conversar? Por que aqui tá mais parecendo regime militar dos bravos!
- Shiiiiii! Janete!- a Alabá tenta conter a exaltação de Janete- Ficou maluca é?- ela olha pros lados, com medo de que alguém tenha notado
- Ah Al! Eu não suporto esse silêncio todo! Pra que esse gelo todo se agente sabe e ele sabe que agente sabe?
- Sabe oque? - Frasão franze o cenho e olha pra Tony, que abaixa os olhos e suspira
- Eu não entendo você Serafina! E muito menos você, senhor Jean Antoine!- Janete continua, mesmo com Alabá insistindo em apertar sua mão- Afinal, Tony, qual é a sua? Me diz, pra quê, pra quê todo esse segredo? O que tem demais você ter família complicada como todo mundo aqui tem?!
- Janete.- eu sussurro, mesmo que no fundo concordasse com tudo.

- Me desculpem, eu não estou mais com apetite, com licença!- essa foi a única frase que Tony disse, antes de sair, como se nada tivesse acontecido.

Não posso dizer: a primeira vez que o vi. Mas posso com certeza descrever “a primeira topada” que me fez olhar pro Jean. Estava irritadíssima pelo fato de que minha professora de história havia me concedido a tarefa de carregar uma enorme pilha de livros até o devido lugar deles, ou seja, a biblioteca, no segundo andar. Andava vacilante, mal enxergando à frente, quando alguém se choca comigo, fazendo os livros desmoronarem.
- Hey! N’a pas de’yeux?! (não tem olhos ?)- grito, sem nem olhar a criatura que continuava imóvel, como que em ‘estado de choque’. – é inacreditável! Parece que o mundo está conspirando contra mim!-múrmuro,me pondo de joelhos e empilhando os livros.
- Pardon, m’a distrait...- a voz responde, as mãos me estendendo um dos livros.
- Bien. – respondo, me levantando já com a pilha nos braços. Finalmente olho em seus olhos.
Bonito, alto, postura elegante.
Mais um exemplar dos mauricinhinhos “leperraultinianos”, pensei. Ele sorri, estendendo a mão para que eu apertasse-

-Jean Antoine.

- Hã... Serafina Rosa! Plaisir!- respondo num sorriso largo e forçado, indo em direção às escadas.

Não tenho certeza, mas acho que ele ficou lá por uns instantes, parado, olhando a garota mais estranha do Le Perrault Plume subir, usando uma bandana vermelha no lugar da gravata.

Um causo interessante foi um dia em que estávamos andando pelo grande “quintal” do colégio, o sol brilhava com força, e nós sentíamos aquela sensação meio boba de felicidade pelo dia bonito. Tirei a gravata do bolso da jaqueta, e comecei a brincar com ela, girando-a no ar. Tony sorriu e arrancou a dele também, e me solicitou a minha. Eu estranhei, mas pelo sorriso dele, sabia que era uma idéia que ele estava a por em prática. Ele então amarrou as duas gravatas pelas pontas, e me estendeu de volta. Eu estreitei os olhos sem entender. Ele sorriu mais uma vez e girou os antebraços pra trás, me fazendo cair a ficha. Eu sorri e comecei a pular corda pelo pátio, enquanto ele me olhava rindo e segurava meu casaco. Louco, sim, ele sempre foi imprevisível.

Depois daquela cena do refeitório, eu fiquei ainda mais certa de que o Tony estava escondendo algo “cabuloso”. Poderia tentar falar com o Claude, perguntar a ele. Mas era impossível. Não só por ele estar do outro lado do país e numa escola militar, mas também porque ele me pareceu muito menos disposto a me contar a vida dele do que o Tony.

O Tony corria. Corria até ficar esgotado. Nunca perguntei se era mero prazer de atleta ou se correr pra ele era uma terapia. Não por falta de coragem, mas por falta de oportunidade. Nunca conseguia alcançá-lo. E quando ele dedica todas as suas energias nas pernas então, nem um maratonista o alcançaria.
Tony corria como louco, pelas redondezas do colégio, quando seus perseguidores oficiais o surpreenderam e resolveram dar-lhe uma lição. Lição do que? Pelo que? Por ser rico bonito e genialmente inteligente?
O dono do sorriso mais bonito do colégio teve o nariz quebrado pelos socos e chutes dados pelos covardes que além de tudo, ainda foram absolvidos de qualquer punição maior do que uma leve advertência.
Agora que eu não podia gritar com ele mesmo. Meu questionário foi guardado para depois.

Ele estava sentado na enfermaria, um enorme curativo em seu nariz, cenho franzido

- Você ficou maluco, Jean?!- pergunto, assim que passei pela enfermeira. Agacho-me na sua frente- Você sabe que eles estavam procurando uma oportunidade de te pegar sozinho, e você sai pra correr à noite?!- seguro sua mão, ele me olha sério

- Non tinha como eu saber que eles estavam na espreita, detrás da fonte, só me esperando!- ele dá os ombros- eu non pude evitar, hoje eu precisava correr.

- Tony!- sento a seu lado- Não me dê um susto desses! Porque não apareceu na aula de artes? – a aula de artes era a única em que nossos horários se cruzavam, já que éramos de turmas diferentes.

- Non estava bem. – responde, olhando pra porta de um jeito distraído.

- Jean, como assim, não estava bem? Você está doente?

- Rosa... Chega de perguntas, hã!- ele franze a testa, me olhando de lado. Eu suspiro-

- Não. Chega de fingir que nada está acontecendo. Tony, quando pretendia me contar sobre ter uma cópia sua andando por Paris dentro de uma farda da aeronáutica, ein?

- Oque?

- Por que não contou sobre a existência do Claude?! Por que nunca me fala da sua vida? Do seu passado? Ou mesmo do seu presente?!- eu levanto e o encaro.

- Non precisa do meu passado pra me conhecer Rosa. E você me conhece, sabe quem sou eu, não sabe?

- As vezes acho que não. – respondo, o fulminando. Ele abaixa a cabeça e suspira

- Só não queria me expor...

- Expor?- franzo o cenho-  Expor ao que? Expor o-quê?!- bato os braços dos lados, disposta a ir até o fim- Meu irmão e eu non somos brigados, se é o que pensa. Nós nos damos bem. – ele finalmente fala, sem me encarar- Ele brigou foi com meu pai, pra ir pra aeronáutica, pelo sonho dele, de ser piloto militar...

- e você...

- eu vim pro Perrault, conforme a vontade do meu pai...

- Mas e você, Tony, qual é o seu sonho?

- Sinceramente?- ele dá os ombros- eu não sei. Eu só... quero ser feliz como todo mundo quer sabe? Sem mais preocupações.

- Como, preocupações?- volto a sentar ao lado dele

- Preocupações, estresse, me descabelar por dinheiro como meu pai fez, não é meu sonho de juventude, garanto.

-‘ Sonho de juventude’. Fala como se tivesse oitenta anos!- eu rio, e ele me retribui o sorriso

- Você é uma graça, sabia?!

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Capitulo 4- A Caixinha de segredos



Le Eternel Amour
Tulipe Rouge

Tony sempre escondia tudo oque dissesse respeito à sua origem e família. E como curiosa convicta, eu sempre tentava arrancar qualquer mínima informaçãozinha dele.
E uma mala abandonada (tá, sob meus cuidados provisoriamente) podia servir como uma bela fonte de informações.

No começo do ano, o Tony foi um dos últimos à voltar para a escola. E lá estávamos nós, eu, Sérgio, Alabá, Janete e Silvia, esperando o trem que o traria juntamente com Frasão. Eles chegaram muito cansados e Tony estava pálido como um papel, Frasão disse que ele estava passando mal. Do estômago talvez. Sérgio e Frasão o levaram até o banheiro da estação, deixando as malas aos nossos cuidados.

Alabá se ocupou em conferir as chamadas no celular do namorado,  Silvia se distraia com seu coelho comilão. Eu olhava pra mala do Tony, depois olhava pra Janete, pra ver se ela me dava razão.
Mas o que ela fez foi arregalar os olhos e balançar a cabeça freneticamente, enquanto pressionava os lábios.
 Mesmo assim, decidi abrir a mala menor, que estava no meu colo (estávamos sentadas num banco) pra pelo menos espiar o que tinha lá dentro...
Escorreguei o zíper até ter uma abertura grande o suficiente pra enfiar a mão lá dentro.
Fui afundando a mão lá e agarrei um tecido, o puxei e reconheci como o cachecol favorito do Tony.
Enfiei de volta e afundei mais a mão, até bater numa coisa dura, que pela profundidade, não poderia ser o fundo da mala. Apalpei até perceber uma marcação, ou seja, era uma caixa, e aquela era a marca da tampa.
 Pela textura, era de madeira, e tinha um cadeado, que foi o empecilho pra que eu pudesse abrir-la. Afastei um pouco a mala e me encurvei pra trás, afim de ver a caixa entre as lãs lá dentro. 

Consegui ver a caixa, envernizada (era meio vermelha) e realmente trancada. Pelo tamanho, não poderia conter muito, (era menor que o porta maquiagem da Janete, garanto) e isso foi o que mais me deixou intrigada. Pena que nessa hora os meninos voltaram do banheiro, e eu não pude investigar mais.
Passei muito tempo querendo xeretar aquela caixa, mais como os aposentos masculinos ficavam na ala oposta à dos femininos, era muito difícil eu poder mexer nas coisas do Tony sem que ele percebesse.

Mas nada do que uma escapada da aula de artes(a professora nem deu por minha falta, acredito) e ter como amiga a Silvia (filha de funcionários= acesso e liberdade de locomoção total pelo colégio) não resolva.

Descobri que o Tony era ainda mais bagunceiro do que eu imaginava, apesar de ser muito higiênico, (sempre achei ele meio paranóico com “as terríveis bactérias assassinas”) ele mantinha pilhas e mais pilhas de livros em cima e debaixo da cama, (incrivelmente a mais arrumadinha do quarto, que dividia com mais três alunos) uns frascos de pastilhas dentro de um baldinho na cômoda me fez rir, pois lembrei como ele era viciado em pastilhas, e que no colégio agente não tinha onde comprar (fora o contrabando dos asiáticos, claro), por isso ele mantinha um estoque. Abri uma das gavetas e comecei a verificar se debaixo das gravatas e pulôveres dele não era o esconderijo daquela caixa que vi (e que no momento, era o que eu mais queria).
 De tanto procurar, eu achei. Dentro da sapateira. Trancada e sem nenhuma dica de onde estaria a chave.


Foi muito frustrante constatar que eu precisava voltar pra assistir a aula da minha querida professora de inglês (a que mais implicava comigo, fora a de história). E o pior: sem ter descoberto nada. Saí de lá na mesma.

Bem, tenho que deixar registrado aqui, que quando descobri o que a caixa continha, não pude deixar de me sentir frustrada. Incrível. Não era o que eu mais queria saber? O que tinha além daquele cadeadozinho? Agora agüenta.

.....

Voltei pra casa, o Sérgio e o Julio chegaram depois, mais ainda sim, muito interessados em respostas coerentes às suas perguntas insistentes e incessantes.
O Julio se roeu de ciúmes, ainda que não admitisse, da versão do meu amigo magrelo e branquelo Tony, mais forte, mais corado e fardado ainda por cima.

Hoje, quando me lembro de que o Tony engordou dali depois de uns meses, e de que eu me alegrei com isso (ele chegava a parecer felino antes, não era de tudo magrelo, mas o Claude sempre foi muito mais “forte” que ele, e não só pelo treino militar), é inevitável que eu me recrimine um pouco. Aparentemente, era mesmo um máximo. Aparentemente.

Bem, e lá estava o Julio, me examinando dos pés a cabeça, Janete ao meu lado, sem entender.

- Então... Aquele era o gêmeo do Jean?- Julio pergunta, encostado no balcão, braços cruzados no peito.

- Era. – respondo rapidamente.

-Na verdade, é né, ele ainda existe, eu acho...- Janete fala baixinho, olhando pro pé do banco a seu lado.

- Hum...- ele coça o queixo- e por que você não me contou antes que o Jean tinha irmão? E irmão gêmeo ainda por cima?

- Julio, eu não sabia!- falo irritada, Sérgio me olha intrigado

- Pior é que ninguém nem sonhava com uma história dessas, o Tony nunca comentou nada sobre ter irmão nenhum!- diz Sérgio, ainda se ocupando digitando nas minúsculas teclas de seu celular

- Ao que me lembre, o Tony nunca fala da família dele né... - Janete diz, me deixando um pouco desconfortável-
Apesar de que agente tá acostumado, já que a maioria dos alunos do Perrault tem a maior dificuldade de falar de suas famílias frigidas e distantes...- Ela se abraça, como se estivesse sentindo frio, eu involuntariamente sinto a mesma necessidade, e enfio os braços dentro do avental pra me esquentar

- Mas não sei... Ele não parece ser como os outros... Não acho que seja um amargurado... – falo, na realidade, mais pra mim mesma acreditar.

- Amargurado talvez não mesmo... Mas talvez seja meio dolorido pra ele Bel... – Janete diz, ainda se encolhendo como eu.

-Talvez seja brigado com a família... – Pondera Julio- Ou tenha muita inveja do irmão.

- Oque? – franzo o cenho- Do quê você está falando Julio?

- Ué, do fato do seu amiguinho ser um branquelo fracote e amargurado. - Julio dá os ombros.

- Mas, como você pode falar assim do Tony?- eu levanto o queixo, o fulminando

- Ah, Bel, qual é!- ele revira os olhos- Tá na cara que o Jean morre de inveja do irmão que conseguiu entrar na aeronáutica enquanto que ele teve que estudar num colégio de maricas!

- Ei!- Sérgio mostra os dentes, assim como os punhos cerrados. Julio apenas mostra as palmas e balança a cabeça

- Calma, foi força de expressão. Mas digo isso por que o Perrault é bem tradicional, enquanto que a escola de cadetes é bem mais... dá hora, entende?- fala, claramente mais empolgado- Poxa, a academia deve ser muito show! Adrenalina, ação, aventura! Nada de... gel ou gravatas todos os dias!

- Que eu saiba, você usou gel e gravata no colégio também, Julio!- Sérgio arqueia as sombracelhas

- É, usei. Mas só porque era obrigatório!- Dá os ombros- Se eu tivesse nascido na França, teria ido pra escola militar, pena que é só pra nativo, né...

- Ow, sabe que aqui o pessoal não acha que ter filho militar é orgulho né...

- Ué Sérgio, você não nasceu no Brasil? – Janete pergunta, estreitando os olhos

- Nasci... Mas eu acho que por ser francês em parte, já que aqui sabe né, filho de francês é francês também, eu podia ter chance de entrar pras forças armadas...

- Ô moleque, você tem a maior grana no banco e além de trabalhar no restaurante ainda quer ir pras forças armadas? Meu, você é muito louco mesmo!- Julio ri, mas Sérgio revira os olhos

- Ah, qual é! Só vou ver a cor da fortuna do meu pai quando tiver quarenta anos, e além do mais, eu quero construir minha vida sozinho!

- É... Com a pensão gorda que você recebe mesmo assim, acho que você tem um belo empurrãozinho pra subida da ladeira do sucesso, né não?-

- Janete!- eu cutuco minha amiga maluca, que ri.

- Ah, Sérgi-ô, fala sério, você bem que merecia ouvir isso né? Sei o quanto é orgulhoso e que as palavras de uma patricinha não te convencem fácil. Mas pensa, você também precisa de seus pais!- é, a Jane me surpreende de novo. Acho que foi numa dessas que ela fisgou meu irmão...

- É. Eu sei sim...- diz entre os dentes, encarando Janete, que sorri vitoriosa pelo seu argumento inteligente.

Bem, depois de muito questionar a mim mesma, acabei chegando a conclusão de que eu poderia arrancar muito mais do que uma simples desculpa do Tony. Que era Jean Antoine, gêmeo idêntico do Claude Antoine! Mas calma, pensei, se eu me mostrar ansiosa de mais, ele com certeza vai me enrolar. E eu queria a história completa, tim tim por tim tim!

-Melhor ir com cautela, e entrar aos poucos no assunto. Se eu chego gritando ele não me conta nada, ao que eu conheço ele, vou levar o maior gelo, que nem na vez que ele me pegou mexendo no armário dele, lembra?- pergunto a Janete, que toma seu super capuchino, lambe o bigode:

- É... Foi mesmo muito azar ele ter chegado bem na hora!

- Eu não quero correr o risco de ficar sem par pro baile de formatura! E antes que diga, eu não tenho mais meu irmão pra essas ocasiões... – rio- ou vai negar que esse posto está devidamente sendo ocupado?

- Ei! Do que está falando!- ela ruboriza, olhando em volta- Pára já com essa história Rosa!

- Hum... Tô de olho, ein, cunhada!- eu gargalho, Janete esconde o rosto entre as mãos, Sérgio aparece-

- E então meninas,  amanhã a essa hora agente desembarca em Verríeres...- ele senta ao lado de Janete, que se mantinha inclinada sobre a mesa, ela arregala os olhos, pois ele cata um pãozinho de dentro da cesta que estava bem na frente dela, eu rio- E de lá agente só sai depois de finalmente dar adeus ao Le Perrault Plume, ao senhor Forger, a senhora Gotta, e infelizmente, à minha querida professora de artes, a holandesa mais super que eu já conheci, senhorita Anne...- ele suspira, Janete se ajeita na cadeira e me encara, eu franzo o cenho

- Ei! Que assanhamento todo é esse, ein?- eu lanço um  guardanapo nele, que dá os ombros

- É melhor já ir pensando com quem vai no baile de formatura, eu já tenho planos.- ele diz, mordendo o pão.

- Hum, é mesmo?- sorrio- E... Quem seria? Quero dizer, quem vai ocupar meu ilustre lugar ao seu lado maninho?

- É segredo.- ele toma um enorme gole de café, e Janete me olha de olhos arregalados, eu balanço a cabeça

- Segredo...