segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Capitulo 4- A Caixinha de segredos



Le Eternel Amour
Tulipe Rouge

Tony sempre escondia tudo oque dissesse respeito à sua origem e família. E como curiosa convicta, eu sempre tentava arrancar qualquer mínima informaçãozinha dele.
E uma mala abandonada (tá, sob meus cuidados provisoriamente) podia servir como uma bela fonte de informações.

No começo do ano, o Tony foi um dos últimos à voltar para a escola. E lá estávamos nós, eu, Sérgio, Alabá, Janete e Silvia, esperando o trem que o traria juntamente com Frasão. Eles chegaram muito cansados e Tony estava pálido como um papel, Frasão disse que ele estava passando mal. Do estômago talvez. Sérgio e Frasão o levaram até o banheiro da estação, deixando as malas aos nossos cuidados.

Alabá se ocupou em conferir as chamadas no celular do namorado,  Silvia se distraia com seu coelho comilão. Eu olhava pra mala do Tony, depois olhava pra Janete, pra ver se ela me dava razão.
Mas o que ela fez foi arregalar os olhos e balançar a cabeça freneticamente, enquanto pressionava os lábios.
 Mesmo assim, decidi abrir a mala menor, que estava no meu colo (estávamos sentadas num banco) pra pelo menos espiar o que tinha lá dentro...
Escorreguei o zíper até ter uma abertura grande o suficiente pra enfiar a mão lá dentro.
Fui afundando a mão lá e agarrei um tecido, o puxei e reconheci como o cachecol favorito do Tony.
Enfiei de volta e afundei mais a mão, até bater numa coisa dura, que pela profundidade, não poderia ser o fundo da mala. Apalpei até perceber uma marcação, ou seja, era uma caixa, e aquela era a marca da tampa.
 Pela textura, era de madeira, e tinha um cadeado, que foi o empecilho pra que eu pudesse abrir-la. Afastei um pouco a mala e me encurvei pra trás, afim de ver a caixa entre as lãs lá dentro. 

Consegui ver a caixa, envernizada (era meio vermelha) e realmente trancada. Pelo tamanho, não poderia conter muito, (era menor que o porta maquiagem da Janete, garanto) e isso foi o que mais me deixou intrigada. Pena que nessa hora os meninos voltaram do banheiro, e eu não pude investigar mais.
Passei muito tempo querendo xeretar aquela caixa, mais como os aposentos masculinos ficavam na ala oposta à dos femininos, era muito difícil eu poder mexer nas coisas do Tony sem que ele percebesse.

Mas nada do que uma escapada da aula de artes(a professora nem deu por minha falta, acredito) e ter como amiga a Silvia (filha de funcionários= acesso e liberdade de locomoção total pelo colégio) não resolva.

Descobri que o Tony era ainda mais bagunceiro do que eu imaginava, apesar de ser muito higiênico, (sempre achei ele meio paranóico com “as terríveis bactérias assassinas”) ele mantinha pilhas e mais pilhas de livros em cima e debaixo da cama, (incrivelmente a mais arrumadinha do quarto, que dividia com mais três alunos) uns frascos de pastilhas dentro de um baldinho na cômoda me fez rir, pois lembrei como ele era viciado em pastilhas, e que no colégio agente não tinha onde comprar (fora o contrabando dos asiáticos, claro), por isso ele mantinha um estoque. Abri uma das gavetas e comecei a verificar se debaixo das gravatas e pulôveres dele não era o esconderijo daquela caixa que vi (e que no momento, era o que eu mais queria).
 De tanto procurar, eu achei. Dentro da sapateira. Trancada e sem nenhuma dica de onde estaria a chave.


Foi muito frustrante constatar que eu precisava voltar pra assistir a aula da minha querida professora de inglês (a que mais implicava comigo, fora a de história). E o pior: sem ter descoberto nada. Saí de lá na mesma.

Bem, tenho que deixar registrado aqui, que quando descobri o que a caixa continha, não pude deixar de me sentir frustrada. Incrível. Não era o que eu mais queria saber? O que tinha além daquele cadeadozinho? Agora agüenta.

.....

Voltei pra casa, o Sérgio e o Julio chegaram depois, mais ainda sim, muito interessados em respostas coerentes às suas perguntas insistentes e incessantes.
O Julio se roeu de ciúmes, ainda que não admitisse, da versão do meu amigo magrelo e branquelo Tony, mais forte, mais corado e fardado ainda por cima.

Hoje, quando me lembro de que o Tony engordou dali depois de uns meses, e de que eu me alegrei com isso (ele chegava a parecer felino antes, não era de tudo magrelo, mas o Claude sempre foi muito mais “forte” que ele, e não só pelo treino militar), é inevitável que eu me recrimine um pouco. Aparentemente, era mesmo um máximo. Aparentemente.

Bem, e lá estava o Julio, me examinando dos pés a cabeça, Janete ao meu lado, sem entender.

- Então... Aquele era o gêmeo do Jean?- Julio pergunta, encostado no balcão, braços cruzados no peito.

- Era. – respondo rapidamente.

-Na verdade, é né, ele ainda existe, eu acho...- Janete fala baixinho, olhando pro pé do banco a seu lado.

- Hum...- ele coça o queixo- e por que você não me contou antes que o Jean tinha irmão? E irmão gêmeo ainda por cima?

- Julio, eu não sabia!- falo irritada, Sérgio me olha intrigado

- Pior é que ninguém nem sonhava com uma história dessas, o Tony nunca comentou nada sobre ter irmão nenhum!- diz Sérgio, ainda se ocupando digitando nas minúsculas teclas de seu celular

- Ao que me lembre, o Tony nunca fala da família dele né... - Janete diz, me deixando um pouco desconfortável-
Apesar de que agente tá acostumado, já que a maioria dos alunos do Perrault tem a maior dificuldade de falar de suas famílias frigidas e distantes...- Ela se abraça, como se estivesse sentindo frio, eu involuntariamente sinto a mesma necessidade, e enfio os braços dentro do avental pra me esquentar

- Mas não sei... Ele não parece ser como os outros... Não acho que seja um amargurado... – falo, na realidade, mais pra mim mesma acreditar.

- Amargurado talvez não mesmo... Mas talvez seja meio dolorido pra ele Bel... – Janete diz, ainda se encolhendo como eu.

-Talvez seja brigado com a família... – Pondera Julio- Ou tenha muita inveja do irmão.

- Oque? – franzo o cenho- Do quê você está falando Julio?

- Ué, do fato do seu amiguinho ser um branquelo fracote e amargurado. - Julio dá os ombros.

- Mas, como você pode falar assim do Tony?- eu levanto o queixo, o fulminando

- Ah, Bel, qual é!- ele revira os olhos- Tá na cara que o Jean morre de inveja do irmão que conseguiu entrar na aeronáutica enquanto que ele teve que estudar num colégio de maricas!

- Ei!- Sérgio mostra os dentes, assim como os punhos cerrados. Julio apenas mostra as palmas e balança a cabeça

- Calma, foi força de expressão. Mas digo isso por que o Perrault é bem tradicional, enquanto que a escola de cadetes é bem mais... dá hora, entende?- fala, claramente mais empolgado- Poxa, a academia deve ser muito show! Adrenalina, ação, aventura! Nada de... gel ou gravatas todos os dias!

- Que eu saiba, você usou gel e gravata no colégio também, Julio!- Sérgio arqueia as sombracelhas

- É, usei. Mas só porque era obrigatório!- Dá os ombros- Se eu tivesse nascido na França, teria ido pra escola militar, pena que é só pra nativo, né...

- Ow, sabe que aqui o pessoal não acha que ter filho militar é orgulho né...

- Ué Sérgio, você não nasceu no Brasil? – Janete pergunta, estreitando os olhos

- Nasci... Mas eu acho que por ser francês em parte, já que aqui sabe né, filho de francês é francês também, eu podia ter chance de entrar pras forças armadas...

- Ô moleque, você tem a maior grana no banco e além de trabalhar no restaurante ainda quer ir pras forças armadas? Meu, você é muito louco mesmo!- Julio ri, mas Sérgio revira os olhos

- Ah, qual é! Só vou ver a cor da fortuna do meu pai quando tiver quarenta anos, e além do mais, eu quero construir minha vida sozinho!

- É... Com a pensão gorda que você recebe mesmo assim, acho que você tem um belo empurrãozinho pra subida da ladeira do sucesso, né não?-

- Janete!- eu cutuco minha amiga maluca, que ri.

- Ah, Sérgi-ô, fala sério, você bem que merecia ouvir isso né? Sei o quanto é orgulhoso e que as palavras de uma patricinha não te convencem fácil. Mas pensa, você também precisa de seus pais!- é, a Jane me surpreende de novo. Acho que foi numa dessas que ela fisgou meu irmão...

- É. Eu sei sim...- diz entre os dentes, encarando Janete, que sorri vitoriosa pelo seu argumento inteligente.

Bem, depois de muito questionar a mim mesma, acabei chegando a conclusão de que eu poderia arrancar muito mais do que uma simples desculpa do Tony. Que era Jean Antoine, gêmeo idêntico do Claude Antoine! Mas calma, pensei, se eu me mostrar ansiosa de mais, ele com certeza vai me enrolar. E eu queria a história completa, tim tim por tim tim!

-Melhor ir com cautela, e entrar aos poucos no assunto. Se eu chego gritando ele não me conta nada, ao que eu conheço ele, vou levar o maior gelo, que nem na vez que ele me pegou mexendo no armário dele, lembra?- pergunto a Janete, que toma seu super capuchino, lambe o bigode:

- É... Foi mesmo muito azar ele ter chegado bem na hora!

- Eu não quero correr o risco de ficar sem par pro baile de formatura! E antes que diga, eu não tenho mais meu irmão pra essas ocasiões... – rio- ou vai negar que esse posto está devidamente sendo ocupado?

- Ei! Do que está falando!- ela ruboriza, olhando em volta- Pára já com essa história Rosa!

- Hum... Tô de olho, ein, cunhada!- eu gargalho, Janete esconde o rosto entre as mãos, Sérgio aparece-

- E então meninas,  amanhã a essa hora agente desembarca em Verríeres...- ele senta ao lado de Janete, que se mantinha inclinada sobre a mesa, ela arregala os olhos, pois ele cata um pãozinho de dentro da cesta que estava bem na frente dela, eu rio- E de lá agente só sai depois de finalmente dar adeus ao Le Perrault Plume, ao senhor Forger, a senhora Gotta, e infelizmente, à minha querida professora de artes, a holandesa mais super que eu já conheci, senhorita Anne...- ele suspira, Janete se ajeita na cadeira e me encara, eu franzo o cenho

- Ei! Que assanhamento todo é esse, ein?- eu lanço um  guardanapo nele, que dá os ombros

- É melhor já ir pensando com quem vai no baile de formatura, eu já tenho planos.- ele diz, mordendo o pão.

- Hum, é mesmo?- sorrio- E... Quem seria? Quero dizer, quem vai ocupar meu ilustre lugar ao seu lado maninho?

- É segredo.- ele toma um enorme gole de café, e Janete me olha de olhos arregalados, eu balanço a cabeça

- Segredo...

Um comentário:

  1. Eita, que esta historia esta ficando cada vez mais interessante e me deixando mais ainda curiosa..... Isso não podeee. hehehehehehehehe

    ResponderExcluir