domingo, 1 de junho de 2014

Capítulo 60- Senhora

Le Eternel Amour
Tulipe Rouge






Belo dia de outono, céu avermelhado, folhas esvoaçantes dançando pelo ar... O que vejo pela vidraça embaçada da janela parece mais um quadro.
Aquela sensação de estar sempre caindo permanece e reina sobre meus sentidos. Estou sempre enjoada, sempre pareço estar prestes a chorar, a perder a razão.
Agora entendo as cartas de Jean, aquelas que eu nunca consegui entender totalmente antes...



    -Você está tão tão tão linda, mamãe!- vejo a figura estoanteante de Caleb, segurando uma margarida e sorrindo da forma mais maravilhosa que alguém pode sorrir, como só ele sabe. Contenho minhas lamúrias, por saber que daqui a algumas horas o verei pela última vez no prazo que me foi dado, 5 anos.

    -Estou mesmo, filho?
     
    -Está sim!


    -A noiva mais linda de toda a Paris!- Jane piscou para Caleb. A vejo pelo espelho, pedindo ao pequeno que nos deixe a sós.

-Você parece exausta, Rosa. - o tom sério dela me põe em estado de alerta.Seus intimidadores olhos  me analisam e os braços se cruzam num gesto impaciente.

-Então cadê a noiva mais linda de toda Paris?...- resmungo, ao que Janete levanta uma sombracelha. Me viro para encará-la.

-Vai fugir, não vai?

-O quê?! - Busco apoio no espelho, evitando uma queda de dramática teatral.

-Não finja indignação!- o tom  era frio e impassível.

-Quem é você e oque fez com minha cunhada doce e meiga?

-Serafina Rosa... -ela evoca de forma persistente- Trate de me confessar!

-Eu estou bem! E perplexa com essas suas ideias!

-A-RÁ! - Ela estica o dedo indicador para mim e meus olhos saltam- Viu só? É disso que eu estou falando! Você não sabe mentir. Não para mim!

-Janete, quer parar com … - sento no banco no qual dantes me equilibrava em pé. Por precaução.

-Eu não estou blefando, Rosa. Você precisa me contar, ou jamais terá minha confiança novamente. O Claude convive com você a menos de um ano e percebeu que você está diferente, porque eu não perceberia?

-Por favor, não me obrigue a isso! - abaixo a cabeça.

-Obrigue a quê? A dizer a verdade? Eu é que pergunto, cadê a Rosa? A que sempre diz a verdade?

-Não faça isso... - a súplica não era para ela, mas a Deus. Porque tem de ser assim tão grande o meu suplício?

-Você tem quinze minutos até que a cabeleleira chegue aqui para colocar sua grinalda. - abro os olhos e percebo que Janete pendera a cabeça para um lado, ainda de braços cruzados. Ela não iria desistir ainda depois disso!

-A acho desnecessária.- suspiro observando meus próprios pés.

-Mas Joana insistiu que você  usasse. - ela dá os ombros.

-Hum... - a olho de esguelha e ela me encara firmemente.

-Sabe que eu não vou deixar que você se case sem que me conte oque está acontecendo, não sabe?
Então eu suspiro e, de cabeça baixa, faço um gesto com a mão para que Janete se sente no pufe a meu lado.

-Escute, é um segredo de vida ou morte. Por isso quero que você faça oque eu disser, tudo bem? -  digo aos sussurros, com a voz embargada.

-Tá, mas..

-Shiii... - me levanto de supetão por perceber que alguém girava a maçaneta.

-Ah ainda bem! -Joana aparece impecavelmente arrumada- estão aqui!- anuncia da porta para alguém ao longe no corredor. Era cabeleireira, naturalmente.

-Demorei? - Uma cabeça repleta de madeixas vermelhas como o sangue surge na porta, com brilhantes olhos azuis e um sorriso enorme.

-Eu estarei na recepção. - Janete se levanta e anda até a porta. Eu aproveito que Joana e a cabeleireira se ocupam com os produtos de beleza  e corro até a porta.

-Espere! - seguro o braço de Janete- Eu tenho algo para você!

-Oque é?

-É o meu segredo. Não me pergunte nada. No carro eu o entregarei a você, e te explico melhor!

-Tudo bem... - ela me olha ainda desconfiada- Agora vai! Não pode se atrasar muito, o reverendo tem mais dois casamentos depois do seu!

-Tá...- volto a sala e aos preparativos de minha tragicomédia. Só que sem a parte da comédia.







   Claude




Algumas pessoas já estavam me encarando, como se esperassem que eu dissesse alguma coisa engraçada, ou sei lá. Esquecem que as gracinhas  cabem sempre a meu amigo tão tão  fascinante senso de humor.

- Mas quem diria ein, amigo? Você conseguiu, cara! A garota é finalmente sua!

- Calma, Frasón! Ainda non casei, hã? Só vou me sentir realmente aliviado depois do “aceito”.

- Quanto tempo vocês vão passar em Veneza?

- Menos do que eu gostaria. Só cinco dias. Rosa non quer ficar muito tempo longe de Caleb..

- Ela está certíssima. Não seria bom para ele ficar longe de vocês mais do que isso. Ele ainda está assustado, e com razão.

- E como vai meu irmón? - suspiro

- Até onde eu sei, na mesma. Quase não se mexe. Sempre com os olhos arregalados.

- Não me suspreenderia se descobrissem que é tudo fingimento.

- Claude!- ele me repreende

- Sociopatia non tem cura!- dou os ombros- Oque mais aquele demônio iria querer? Ele já me tirou tudo!

- Claude se controle, estamos numa igreja!

- Falar nisso, onde está o reverendo? Ele non já tinha que estar aqui?

- Está se preparando. Você devia ir lá conversar um pouco com ele. Tenho certeza de que te faria muito bem!

- Eu só estou aqui pela Rosa, entendeu? Porque eu iria querer ouvir sermões...

- Você não fez mesmo as pazes com Deus, não é?

- Frazón, non quero falar disso. Hoje é meu casamento. Non quero me aborrecer pensando nessas coisas..



Janete



Entramos no carro e Rosa parecia pálida, apesar de todo o blash. Seus dedos enluvados em renda me entregam um envelope, e ela me diz que só poderia abrir dali um mês, não importasse oque acontecesse, sob jura de nossa eterna amizade.

-Por favor, Jane, nunca te peço nada! Mas desta vez é sério. Confie em mim, você entenderá tudo quando abrir esse envelope.

- Sabe que pode contar comigo, não sabe?
Ela afirma com um gesto e desce do carro.

A cerimônia não poderia ser mais encantadora, com sorrisos e bençãos vindo de todos os lados. Rosa parecia melhor quando acompanhada de Claude. Ele ascendia algo nela, como a chama duma vela. Eu nunca a vi tão feliz antes na vida.
Mas havia um envelope e sussurros suplicando que eu fizesse tudo como ela me pediu. Isso me preocupa. Sinto que há algo errado!

-O reverendo quer falar com o Claude. Mas ele não quer.

-E porque? - pergunto ainda sorrindo e acenando para alguns conhecidos ao longe.

-Não sei direito.. Mas parece que eles já se conhecem. - Sérgio me abraça. Sinto um calafrio.

-Já se conhecem?

-É, amor. Como eu disse, parece. Eles são como velhos conhecidos. Acho que o Claude congregava aqui quando mais jovem.

-Nossa.. será que tem alguma coisa haver com o estado de nervos da Rosa? Será que é por causa de algum desentendimento entre ele e o reverendo? Talvez Rosa estivesse com  medo de que Claude desistisse do casamento religioso...

-Não faz sentido, amor. Seu Giovanni é católico e , se existisse alguma tensão nesse sentido, seria por causa dele e não pelo Claude.

-Mas se ele brigou com o reverendo...

-Os dois concordaram que seria aqui. Os dois juntos. Eu estava no dia em que vieram marcar. Foi aí que percebi que  Claude o conhecia. Não havia uma tensão por parte do reverendo, mas sim pela do Claude. O homem o tratou como a um filho e pareceu radiante pelo casamento. Mas o senhor Geraldy estava com uma carranca assustadora, mas as vezes ele parecia estar constrangido com este lugar...

- Que estranho. O Claude nunca pareceu um homem religioso...

-Talvez ele seja sim, por isso ele é desse jeito. Não lembra daquela frase?

-”A religiosidade é que te afasta de Deus”.  - meneio a cabeça- Pode ser. Talvez ele tenha ficado assim depois da morte da mãe. Era oque Jean dizia, se lembra?

-E tinha aquele velhinho do azilo de Verríeves, que disse uma vez que conhecia o irmão do Jean, e ele mandou que se calasse, se lembra? Depois aquele senhor me disse que o irmão não era como Jean, que ele tinha raiva de Deus.  O Claude é sempre tão duro com a vida, tão sério. Taí, tinha me esquecido de que quando se é religioso, a severidade toma conta da vida da pessoa.

-Ele é duro até consigo mesmo... Ai credo Sérgio, me deu um arrepio! Vamos ali  conversar com a sua mãe, ou melhor, vá procurar Alice!







Rosa


Dançamos tanto que me sinto zonza. Claude estava encostado num canto, com os olhos fechados, e quando o abraço, ele sorri.

-Estava com saudades, hã?

-Ai, meus pés estão começando a doer!

-Oque acha de nos despedirmos?

-Acho que algumas senhoras vão lamentar a saída do maior pé de valsa da cidade! - rio e ele me aperta em seus braços

-Enton é um sim? - Claude me beija  e em seguida me arrasta até a mesa da família.

-Mas já?!- Joana protesta e eu finjo lamentar com um gesto.

-Ah, mamãe, lembre-se do meu com Janete? Nem cortamos o bolo! - Sérgio pisca para Jane que arde como uma malagueta .

-Papai? - estendo a mão na direção do único que ficou sério durante toda a cerimônia e toda a festa. Ele beija minha testa,sussurra “dio te benedicca” e sai  pelo gramado, tropeçando em algumas lanternas de papel. Sei que tem muita coisa diferente do que ele sonhou, em todos os sentidos.

Eu caminhei pelo aeroporto certa que essa seria a última vez que viajo com o Claude, por tempo indeterminado. Apertava a mão dele como que para diminuir o aperto em meu peito, que só aumentava a cada instante.

A cada novo  segundo, Claude parecia mais bonito, e eu me apaixonava ainda mais por ele. Talvez isso se devesse ao fato de que não poderia permanecer ao lado dele, e eu me desesperava ainda mais.

Veneza era muito além daquilo que eu imaginava, em grandeza e fascinação. Eu quase me senti  feliz quando passeamos de barco pela cidade, e quase chorei quando ele sussurrou sorrindo  “senhora Geraldy” …

O anel de noivado de sua avó ainda estava em meu dedo. E percebi que se o devolvesse ele talvez pudesse dá-lo para outra pessoa. Que pudesse ser feliz sem mim.
Tal pensamento me fez estremecer no meio da madrugada. Me virei na cama e vi seus olhos  cintilantes à meia luz, tão brilhantes como nunca antes vi. Então ele tomou meus dedos entre os  seus e beijo-os um por um, me puxando para seu peito em seguida. Ouvir o coração dele bater de forma tão nítida me trouxe uma paz inexplicável.

Antes que Claude acordasse, me vesti e sai deixando o anel no travesseiro, junto com meu coração. Mas disso ele não sabe e nem pode saber. Ou eu estaria arruinada para sempre.  Não suportaria viver sem ele. Longe dele, talvez. Mas sem ele? Como poderia viver num mundo onde ele não respirase, onde o coração mais lindo do mundo não batesse?
Posso parecer covarde por preferir não arriscar e contar tudo e desobedecer as ordens malucas daquele lunático. Mas se isso significa que a chance de um ataque contra a vida do Claude está em eminência...
 E também, pela segurança de Caleb. Não posso dar-me o luxo de colocar a vida dele em perigo. E seria muito egoísmo  eu ficar com Caleb só para mim novamente. Claude esperou tanto para poder estar com o filho, que por dez anos inteiros, foi só meu.
Ele tem todo o direito de ficar com Caleb, especialmente depois de toda a tragédia que lhe aconteceu. Acho ele não suportaria ficar completamente só. Antes ele tinha Jean, depois Nara, Frazão e Rachel. Agora, se eu o deixar sem ninguém por perto.. Oh Deus!











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