sábado, 1 de outubro de 2011

Mais uma de amor





            "Existe uma coisa sobre a música e sobre o amor, que nunca foi explicado. Na verdade, o amor e a música são coisas tão parecidas... Ambos envolvem paixão, loucura e êxtase... Em medidas e quantidades parecidas. O que, aliás, apenas reforça a teoria de que a música surgiu na tentativa de um apaixonado de expressar oque ele estava sentindo... Não saiu palavras, mas melodia...

Na alegria, depois do riso, muitos costumam cantar... Ou na profunda tristeza, a música está lá, presente, viva."


- É por hoje chega... Amanhã eu termino essa página...

- Ô Rosa, você ainda está ai? Nossa seu horário já deu faz tempo menina!

- É eu sei... mas é que eu acabei me entretendo com meu livro....

- Que livro?

- O meu, horas!

- Ah tá... de novo com essa estória de escrever livro?

- Assim que lançar, te dou um autografado tá?

- Tchau Rosita... Juízo ein!

- Eta mais olha que eu sou uma menina de respeito ein! de família! hahah Tchau!

Quem vê aquela menina passando apressada por estar atrasada pra pegar o ônibus... Nada sabe sobre quem realmente ela é... Sonhadora, responsável e maluquinha... Tudo numa só criatura inquieta... ou seria quieta? Quando às vezes ela some e de repente é descoberta num cantinho, lendo um livro, ouvindo uma música no fone de ouvido... rindo e/ou chorando sozinha?

- Não sabe... Mas como não sabe se eu te confiei o meu dinheiro e faz mais de dois meses que não vejo falar dele? Eu preciso saber oque está acontecendo!

- Olha senhor... as ações que o senhor tinha....

- Tinha? Mas como tinha? O senhor que não venha me dizer que...

- Sinto muito... as empresas faliram e as ações... nada mais valem...

Mais um. Claude ajeita os óculos, estes que só usa para a leitura. Estes que esconde de todos. Mais um cliente que sai furioso. Mas oque ele pode fazer? Esse é o trabalho dele na verdade. Ele simplesmente vem e diz: Sinto muito, seu dinheiro foi torrado por mais um empresário salafrário, que só vendeu ações pra cobrir dívidas. Dívidas externas, estrangeiras. Como ele poderia adivinhar que esse cidadão tinha conta no exterior? Como saberia que ele teria um empréstimo não pago? Milionário, como?

Droga. Se ele for demitido, como vai poder realizar o sonho de fundar o próprio negócio? Como poderá ter dinheiro pra permanecer no Brasil sem ter que trabalhar pra outrem?

Se esse visto vencer de novo... Ah quantas vezes ele pensou em desistir! Quando estava lá, na cidade natal dele, vivendo na periferia graças a um energúmeno que roubou toda a fortuna de sua família... aquele cretino que roubou tudo do inventário... tudo do testamento do pai de Claude... e agora, agora que ele ficou pobre... nem seus parentes mais próximos abriam os magníficos portões de suas gigantescas mansões pra ele. Nem um emprego eles lhe deram. Nada.

Ele foi arranjar ajuda logo com quem? com Frasão, o filho engraçado do também otimista motorista da família. Depois que tudo aconteceu, o coitado do pai do agora melhor amigo de Claude teve um enfarto...  e os dois viram pra cá. Para a terra que  bem acolhe a todos. Ou não.

- Claude... Claude você precisa ter paciência,meu amigo!

- Oque? Eu ter paciência? Você já reparou em como tudo dá errado pra mim?

- Oque eu reparei foi em como você reclama de tudo sempre e o tempo todo. Tem que... relaxar um pouco né?

- Relaxar... estou com medo Frazón... medo por que vai chegar uma hora em que todos vão se virar pra mim e me engolir! É! Me engolir!

- De novo aquele pesadelo lá é? Aquele pesadelo do Tiago te demitindo, da embaixada te caçando e...

- Das portas da França se fechando na minha cara...

- Ai nossa você tá é pirando... Para de ficar se auto-pressionando! É muita coisa pra uma só cabeça!

- Frazón... eu vou pra casa...

- Tudo bem.. Eu não vou agora, sabe que eu tenho que estar no fórum do outro lado da cidade hoje a noite... tribunal importante pra eu assistir...

- Tá... vai com o carro entón... eu pego um ônibus...

O ônibus que a nossa Rosa lutava pra alcançar... o ônibus pára no ponto, que fica entre duas esquinas. Claude vem da rua da direita, Rosa da rua da esquerda... mas bem mais atrasada...

-Droga... onde está minha carteira?...

 Claude começa a se apalpar, conferindo os bolsos, ele é o último da fila...

- Se eu perder este... só pego o das oito!

E as oito, Rosa sabia, ela tinha que estar na academia...

- ai! – uma mulher gritou, ao se assustar com a moça que saiu em disparada ao avistar o ônibus à uns vinte metros... e parece que só faltava uma pessoa pra subir no primeiro degrau...


- Espeeeeraaaa!- ela ria enquanto muitos se assustavam... afinal, uma pessoa correndo e gritando no meio da rua só podia dizer uma coisa..

- Ah mas o quê que issi? É arrastón?

- Não, Gastón, é só eu chegando atrasada mesmo!- ria a mais recente passageira

- Senhor...- o cobrador já estava impaciente antes mas agora estava ainda mais

- ah, me desculpe...

- Imigrantes... – brincou sarcástica, fazendo soar um sotaque italiano, oque fez o moço à frente a olhar de esguelha, meio sem entender oque essa criatura achava tão engraçado e tão legal na vida...

Depois de passar a catraca, Claude encontrou um lugar vago pra poder sentar! Milagre! Ele nunca conseguia a janela... sempre ia em pé ou sentava do lado de alguém desagradável... Quando a moça do arrastão sentou do lado dele, ele quase espraguejou, mas como bom homem educado que era, ficou bem calado.

- Se importa de abrir o vidro?

- Me desculpe. Mas non consigo fazer isso non... abrir o vidro... ou eu teria que quebrá-lo com a marretinha, ou entón precisaria de um maçarico pra furá-lo...

- Nossa como você é mau humorado

- Non, você non viu a piada que acabei de fazer?

- Não, porque a piada não foi escrita, foi falada, então, ouvida, e não vista.

- Muito inteligente, parabéns.

- Obrigada. Mas ainda estou com calor, por favor abre a janela? Ou deixa eu abrir?

- À vontade.- ele se encolheu, e ela se esticou. Pra deparar com um vidro sem janela.

- Droga... por que não disse logo?

- Você non perguntou. Só me perguntou se eu podia abrir, e eu respondi. Non.

- aaarg

Ela ficava ainda mais bonita zangada, ele pensou. A maneira como ela espremia o lábio num biquinho era gracioso... ele não resistiu a o impulso de curvar os lábios num sorriso real e verdadeiro.

- Não ri de mim!- ela ponderou, olhando profundamente nos olhos dele. Ela agora ria também, mas de um jeito diferente... ela passa a mão no rosto e abaixa um pouco a cabeça...

Ele continua olhando pra ela, até que ela move a cabeça, decide levantar e abrir a “janela do teto” do ônibus, como ela dizia... Mas ela não conseguia empurrar... ela era um tanto baixinha e não tinha a força suficiente. Claude de prontidão se levanta pra ajudar, mas um “bombadão careca” chega primeiro e abre num só golpe a abertura de teto do ônibus. Rosa se espanta um pouco mas logo agradece e se senta completamente sem graça pelo olhar que o rapaz careca lhe lança. Claude sentiu um incomodo terrível a ponto de querer chamar a atenção do homem para que parasse de encarar a moça desconhecida. Mas as palavras ficaram em sua garganta, e ele apenas tossiu. Isso, para a sorte dele, foi o suficiente pra que o rapaz percebesse sua presença ao lado de Rosa, e então fosse para o fundo do ônibus.

- Precisa comer mais arroz e feijón ein?- ele sorri

- Não... preciso comer fermento pra ver se eu cresço mais um pouquinho... Droga... meu celular acabou a bateria...

- Quer usar o meu?

- Obrigada... Eu aceito por que realmente é importante...

Ela disca os números rapidamente, Claude percebeu, então, é um número pro qual ela liga freqüentemente...

- Alô? Oi... mãe... é que... meu celular acabou a bateria... eu... sai atrasada e nem tive tempo de ligar... tá... tá, beijos.

- Tudo certo?

- Ah, sim, obrigada... é que... eu moro com uma amiga e... minha família fica preocupada... ligo todos os dias pontualmente as seis da tarde pra eles... mas hoje...

- Você se enrolou toda non?

- É... – ela sorriu em retribuição a ele.

- Eu... posso tirar uma foto sua?- ele tira uma enorme câmera preta da mochila

-Oque?

- É que... eu sou fotógrafo nos finais de semana e...

- Hoje é sábado...- ela brinca

- É sim.. e...eu adoro tirar fotos... dos outros...- ele ri

- Eu também... dos outros... Mas pra quê você quer uma foto minha?

- É que... eu gosto de tirar foto das pessoas quando elas deixam de ser estranhas pra mim...

- E eu não sou estranha?- faz careta

- Bem... é...- eles riem- mas... não é mais pra mim.

- Tudo bem, você me deixou confusa... Mas.. eu deixo... – ela ajeita a faixa do cabelo e põe as tiras do laço pra frente,junto com o cabelo- Estou bem?

- Sempre...- ele sorri e levanta a câmera, que não faz nenhum barulho ou flash

- Já?

- Oui... quer ver? – ele mostra a foto no visor... ela está com um sorriso largo, um olhar brilhante...- Ficou linda...


Eles descem na mesma parada, mas, seguem caminhos opostos. Ele não vai para casa, como havia dito pra Frasão, porque apareceu uma festa de debutante pra ele “cobrir”. O amigo dele, Colibri, seria o fotógrafo, mas acabou tendo que ficar com a avó doente e não pôde ir. Então... mais uma graninha extra para Claude guardar na poupança...


- Tudo bem... agora, só a aniversariante.

- Ah mas como assim? E a mãe não aparece nessa foto também?- a mulher franze a testa, e Claude abre mais um sorriso amarelo..tanta canseira acumulada da semana, e mais uma mãe de debutante tentando chamar a atenção

- Non... essa é só dela, hã?

Rosa chega afobada... Todo mundo já estava se aquecendo...e ela ainda tinha que se trocar! Vem um menino e passa cola no mural todo cheio de restos de anúncios rasgados e velhos... e gruda no cavalete uma folha amarela... como a cara da Rosa ao ler:

Seleção para a companhia de dança da fundação Fagulha ... Inscreva-se!


Os olhos dela então foram parar no Coliseu em Roma... No teatro de Paris... Londres... mas uma voz a chamou de volta à São Paulo:

- Oi coelho branco! Perdeu o relógio hoje foi?

- Como na semana passada! Desculpa professor! – ela corre pro vestiário sem olhar pra trás e perceber os olhos brilhando do professor ao vê-la...










continue...

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