sábado, 1 de outubro de 2011

Mais uma de amor





            "Existe uma coisa sobre a música e sobre o amor, que nunca foi explicado. Na verdade, o amor e a música são coisas tão parecidas... Ambos envolvem paixão, loucura e êxtase... Em medidas e quantidades parecidas. O que, aliás, apenas reforça a teoria de que a música surgiu na tentativa de um apaixonado de expressar oque ele estava sentindo... Não saiu palavras, mas melodia...

Na alegria, depois do riso, muitos costumam cantar... Ou na profunda tristeza, a música está lá, presente, viva."


- É por hoje chega... Amanhã eu termino essa página...

- Ô Rosa, você ainda está ai? Nossa seu horário já deu faz tempo menina!

- É eu sei... mas é que eu acabei me entretendo com meu livro....

- Que livro?

- O meu, horas!

- Ah tá... de novo com essa estória de escrever livro?

- Assim que lançar, te dou um autografado tá?

- Tchau Rosita... Juízo ein!

- Eta mais olha que eu sou uma menina de respeito ein! de família! hahah Tchau!

Quem vê aquela menina passando apressada por estar atrasada pra pegar o ônibus... Nada sabe sobre quem realmente ela é... Sonhadora, responsável e maluquinha... Tudo numa só criatura inquieta... ou seria quieta? Quando às vezes ela some e de repente é descoberta num cantinho, lendo um livro, ouvindo uma música no fone de ouvido... rindo e/ou chorando sozinha?

- Não sabe... Mas como não sabe se eu te confiei o meu dinheiro e faz mais de dois meses que não vejo falar dele? Eu preciso saber oque está acontecendo!

- Olha senhor... as ações que o senhor tinha....

- Tinha? Mas como tinha? O senhor que não venha me dizer que...

- Sinto muito... as empresas faliram e as ações... nada mais valem...

Mais um. Claude ajeita os óculos, estes que só usa para a leitura. Estes que esconde de todos. Mais um cliente que sai furioso. Mas oque ele pode fazer? Esse é o trabalho dele na verdade. Ele simplesmente vem e diz: Sinto muito, seu dinheiro foi torrado por mais um empresário salafrário, que só vendeu ações pra cobrir dívidas. Dívidas externas, estrangeiras. Como ele poderia adivinhar que esse cidadão tinha conta no exterior? Como saberia que ele teria um empréstimo não pago? Milionário, como?

Droga. Se ele for demitido, como vai poder realizar o sonho de fundar o próprio negócio? Como poderá ter dinheiro pra permanecer no Brasil sem ter que trabalhar pra outrem?

Se esse visto vencer de novo... Ah quantas vezes ele pensou em desistir! Quando estava lá, na cidade natal dele, vivendo na periferia graças a um energúmeno que roubou toda a fortuna de sua família... aquele cretino que roubou tudo do inventário... tudo do testamento do pai de Claude... e agora, agora que ele ficou pobre... nem seus parentes mais próximos abriam os magníficos portões de suas gigantescas mansões pra ele. Nem um emprego eles lhe deram. Nada.

Ele foi arranjar ajuda logo com quem? com Frasão, o filho engraçado do também otimista motorista da família. Depois que tudo aconteceu, o coitado do pai do agora melhor amigo de Claude teve um enfarto...  e os dois viram pra cá. Para a terra que  bem acolhe a todos. Ou não.

- Claude... Claude você precisa ter paciência,meu amigo!

- Oque? Eu ter paciência? Você já reparou em como tudo dá errado pra mim?

- Oque eu reparei foi em como você reclama de tudo sempre e o tempo todo. Tem que... relaxar um pouco né?

- Relaxar... estou com medo Frazón... medo por que vai chegar uma hora em que todos vão se virar pra mim e me engolir! É! Me engolir!

- De novo aquele pesadelo lá é? Aquele pesadelo do Tiago te demitindo, da embaixada te caçando e...

- Das portas da França se fechando na minha cara...

- Ai nossa você tá é pirando... Para de ficar se auto-pressionando! É muita coisa pra uma só cabeça!

- Frazón... eu vou pra casa...

- Tudo bem.. Eu não vou agora, sabe que eu tenho que estar no fórum do outro lado da cidade hoje a noite... tribunal importante pra eu assistir...

- Tá... vai com o carro entón... eu pego um ônibus...

O ônibus que a nossa Rosa lutava pra alcançar... o ônibus pára no ponto, que fica entre duas esquinas. Claude vem da rua da direita, Rosa da rua da esquerda... mas bem mais atrasada...

-Droga... onde está minha carteira?...

 Claude começa a se apalpar, conferindo os bolsos, ele é o último da fila...

- Se eu perder este... só pego o das oito!

E as oito, Rosa sabia, ela tinha que estar na academia...

- ai! – uma mulher gritou, ao se assustar com a moça que saiu em disparada ao avistar o ônibus à uns vinte metros... e parece que só faltava uma pessoa pra subir no primeiro degrau...


- Espeeeeraaaa!- ela ria enquanto muitos se assustavam... afinal, uma pessoa correndo e gritando no meio da rua só podia dizer uma coisa..

- Ah mas o quê que issi? É arrastón?

- Não, Gastón, é só eu chegando atrasada mesmo!- ria a mais recente passageira

- Senhor...- o cobrador já estava impaciente antes mas agora estava ainda mais

- ah, me desculpe...

- Imigrantes... – brincou sarcástica, fazendo soar um sotaque italiano, oque fez o moço à frente a olhar de esguelha, meio sem entender oque essa criatura achava tão engraçado e tão legal na vida...

Depois de passar a catraca, Claude encontrou um lugar vago pra poder sentar! Milagre! Ele nunca conseguia a janela... sempre ia em pé ou sentava do lado de alguém desagradável... Quando a moça do arrastão sentou do lado dele, ele quase espraguejou, mas como bom homem educado que era, ficou bem calado.

- Se importa de abrir o vidro?

- Me desculpe. Mas non consigo fazer isso non... abrir o vidro... ou eu teria que quebrá-lo com a marretinha, ou entón precisaria de um maçarico pra furá-lo...

- Nossa como você é mau humorado

- Non, você non viu a piada que acabei de fazer?

- Não, porque a piada não foi escrita, foi falada, então, ouvida, e não vista.

- Muito inteligente, parabéns.

- Obrigada. Mas ainda estou com calor, por favor abre a janela? Ou deixa eu abrir?

- À vontade.- ele se encolheu, e ela se esticou. Pra deparar com um vidro sem janela.

- Droga... por que não disse logo?

- Você non perguntou. Só me perguntou se eu podia abrir, e eu respondi. Non.

- aaarg

Ela ficava ainda mais bonita zangada, ele pensou. A maneira como ela espremia o lábio num biquinho era gracioso... ele não resistiu a o impulso de curvar os lábios num sorriso real e verdadeiro.

- Não ri de mim!- ela ponderou, olhando profundamente nos olhos dele. Ela agora ria também, mas de um jeito diferente... ela passa a mão no rosto e abaixa um pouco a cabeça...

Ele continua olhando pra ela, até que ela move a cabeça, decide levantar e abrir a “janela do teto” do ônibus, como ela dizia... Mas ela não conseguia empurrar... ela era um tanto baixinha e não tinha a força suficiente. Claude de prontidão se levanta pra ajudar, mas um “bombadão careca” chega primeiro e abre num só golpe a abertura de teto do ônibus. Rosa se espanta um pouco mas logo agradece e se senta completamente sem graça pelo olhar que o rapaz careca lhe lança. Claude sentiu um incomodo terrível a ponto de querer chamar a atenção do homem para que parasse de encarar a moça desconhecida. Mas as palavras ficaram em sua garganta, e ele apenas tossiu. Isso, para a sorte dele, foi o suficiente pra que o rapaz percebesse sua presença ao lado de Rosa, e então fosse para o fundo do ônibus.

- Precisa comer mais arroz e feijón ein?- ele sorri

- Não... preciso comer fermento pra ver se eu cresço mais um pouquinho... Droga... meu celular acabou a bateria...

- Quer usar o meu?

- Obrigada... Eu aceito por que realmente é importante...

Ela disca os números rapidamente, Claude percebeu, então, é um número pro qual ela liga freqüentemente...

- Alô? Oi... mãe... é que... meu celular acabou a bateria... eu... sai atrasada e nem tive tempo de ligar... tá... tá, beijos.

- Tudo certo?

- Ah, sim, obrigada... é que... eu moro com uma amiga e... minha família fica preocupada... ligo todos os dias pontualmente as seis da tarde pra eles... mas hoje...

- Você se enrolou toda non?

- É... – ela sorriu em retribuição a ele.

- Eu... posso tirar uma foto sua?- ele tira uma enorme câmera preta da mochila

-Oque?

- É que... eu sou fotógrafo nos finais de semana e...

- Hoje é sábado...- ela brinca

- É sim.. e...eu adoro tirar fotos... dos outros...- ele ri

- Eu também... dos outros... Mas pra quê você quer uma foto minha?

- É que... eu gosto de tirar foto das pessoas quando elas deixam de ser estranhas pra mim...

- E eu não sou estranha?- faz careta

- Bem... é...- eles riem- mas... não é mais pra mim.

- Tudo bem, você me deixou confusa... Mas.. eu deixo... – ela ajeita a faixa do cabelo e põe as tiras do laço pra frente,junto com o cabelo- Estou bem?

- Sempre...- ele sorri e levanta a câmera, que não faz nenhum barulho ou flash

- Já?

- Oui... quer ver? – ele mostra a foto no visor... ela está com um sorriso largo, um olhar brilhante...- Ficou linda...


Eles descem na mesma parada, mas, seguem caminhos opostos. Ele não vai para casa, como havia dito pra Frasão, porque apareceu uma festa de debutante pra ele “cobrir”. O amigo dele, Colibri, seria o fotógrafo, mas acabou tendo que ficar com a avó doente e não pôde ir. Então... mais uma graninha extra para Claude guardar na poupança...


- Tudo bem... agora, só a aniversariante.

- Ah mas como assim? E a mãe não aparece nessa foto também?- a mulher franze a testa, e Claude abre mais um sorriso amarelo..tanta canseira acumulada da semana, e mais uma mãe de debutante tentando chamar a atenção

- Non... essa é só dela, hã?

Rosa chega afobada... Todo mundo já estava se aquecendo...e ela ainda tinha que se trocar! Vem um menino e passa cola no mural todo cheio de restos de anúncios rasgados e velhos... e gruda no cavalete uma folha amarela... como a cara da Rosa ao ler:

Seleção para a companhia de dança da fundação Fagulha ... Inscreva-se!


Os olhos dela então foram parar no Coliseu em Roma... No teatro de Paris... Londres... mas uma voz a chamou de volta à São Paulo:

- Oi coelho branco! Perdeu o relógio hoje foi?

- Como na semana passada! Desculpa professor! – ela corre pro vestiário sem olhar pra trás e perceber os olhos brilhando do professor ao vê-la...










continue...

domingo, 25 de setembro de 2011

Capitulo 46- As mariposa na lâmpida



Le Eternel Amour
Tulipe Rouge


Cobri todos os espelhos com lençóis brancos, para que Alice não fique ainda mais triste. Tão calada tão... frágil... espero que fique boa logo... espero ouvir risos e vozes de crianças brincado... Porque tudo oque tenho visto neles é uma estranha maturidade... uma maturidade que veio de sofrer eu sei... Mas não quero isso. Não aceito... pois tudo oque eles têm tido são conversas... Olhos um tanto pensativos, distraídos, até.... Mas firmes... sem choro algum.

- Recebi uma ligação da Rússia...

- Mesmo? e... de quem?

- Dun... aquele meu amigo lembra?

- Ah... o do cabelo enrrolado...

-É... ele me deu uma excelente notícia!

-mesmo?

-hunhum

- e não vai me contar?

- Sei não... acho melhor fazer surpresa!


Rachel


-Dáaadi!


-Olá meu amor... mas que saudade!

- Dádi... Cadê meu pai?

- Não se preocupe... que logo ele aparece!

Esta era uma conversa de quase todos os dias... depois da escola.
Papai não chegava às cinco como eu... mas sim às seis. E essa hora eu aproveitava pra ficar no quarto dele, ouvindo músicas e vendo os álbuns de família que ele escondia de mim.
Meu tio Jean... parece tão gentil...tão convidativo... só de olhar dá vontade de contar um segredo pra ele.  Ele parece ser compreensivo... mas não compreendido...
De qualquer forma... sei que não vou poder confiar nada à ele. Ele não está aqui pra me ouvir. Mas papai agora também não.
Queria ter conhecido o tio Jean... ele se parece muito com meu papai...
Queria que estivesse aqui... Pra poder dizer que eu sinto falta do papai. Que queria que a Rosa fosse minha mãe... Que estou com medo... que sinto um frio na espinha...

Chegou uma moça na casa... a mãe da menina de rosto cortado... Ela parece tão infeliz... mas porque? Se tem o pai e a mãe dela pertinho dela? Todos os dias?
As minhas amigas também eram assim... Difíceis de se satisfazer... Queriam sapatos novos... novos celulares... Festas e presentes caros... As vezes eu ficava triste por não ter tudo como elas... mas agora eu sei...  eu sempre tive TUDO.
 E meu pai certamente é meu bem maior.


Rosa


Papai... eu sempre soube, na verdade. Eu sempre soube, alguma parte de mim tinha toda a certeza. Eu sinto muito papai. Não consigo ficar triste de saber que ele está vivo. Isso é estranho o suficiente pra eu não querer mudar nada. Nem meus conceitos. Papai, eu aprendi, ouvindo as musicas que você ouvia, lendo os livros que você leu...  Acredito que eu sei, tudo oque em tese, você teria me dito. Eu não me importo, se eles acham que sou estranho. Não me importo se dizem que sou um nerd órfão. Não me importo da Rachel existir, não mais. Na verdade, nem sei do que eu estou falando. Mas gostaria de ouvir sua risada, a mamãe diz que era a coisa mais maravilhosa de ouvir. E que quando você ria, todo mundo ria também. Estou aqui, escrevendo no seu caderno, em sua memória e homenagem. Que o Claude esteja bem, papai, cuide dele. Que ele possa ser quem o senhor tanto sonhou que ele fosse. E no momento, o mais importante: que ele seja um super herói. Que ele faça jus ao fardo que lhe foi dado. Aquele homem é meu pai, e espero que ele queira a mim como filho. Sempre vou te amar papai, e vou te enxergar nele, eu prometo. E que ele te enxergue em mim também!

 Não sei se choro, se rio, se me debato. Oque sentir nessa hora? O Caleb saiu correndo e fechou o caderno, mas eu abri na página certa, mas talvez na hora errada. Acredito que não estou preparada para saber o que o meu filho está sentindo agora. Nem mesmo para suportar aquilo que eu sinto. O meu amor, o Jean, se estivesse aqui, me sustentaria. Mas como ele não está, me sustento nele mesmo assim. Em saber que ele me diria que tudo ficará bem, eu fecho os olhos e penso nele, e no suporte que ele sempre foi pra mim.
Nos dias de crise, ele me fazia rir. Sim, e só ele conseguia! Se o Tony estivesse aqui, ele me diria para esquecê-lo. Para esquecê-lo e seguir em frente.
Mas nisso ele está errado. É exatamente pela vida dele, e pelo que oque significou na minha vida, que eu vou conseguir. Vou ser forte, e vou seguir em frente. E tomei uma decisão. Se o Claude realmente quiser, ele será o pai do Caleb.  E seja oque Deus quiser!

Janete

Eu me sinto esquisita, e parece que acabei de acordar na banheira. O vapor no espelho, os frascos na penteadeira. Tudo como sempre, como se fosse mais uma manhã entre todas. Tudo oque consigo pensar, é no meu marido, em minha filha. Nos olhos deles brilhando  e em seus sorrisos abertos me recebendo num abraço. A minha cabeça ainda está confusa, mais oque sei é que tive sorte, não morri, eu prevaleci. Eles cortaram meu cabelo, e depois me jogaram numa rua lamacenta, num país desconhecido. Só Deus sabe como cheguei a Moscou, e encotrei Dun. Ele quase não me reconheceu, eu estava suja, com cobertores nas costas, e falava arfando, por causa duma bruta pneumonia que contrai. O resto, foi hospital, soro e muita dor. A ironia é que o lugar que antes era pra mim entre todos o que me causava mais entusiasmo e energia, desta vez pareceu sugar toda minha fé. Parecia que eu jamais sairia de lá. Como alguns dos meus primeiros pacientes, no começo de tudo. Mas agora, eu era a doente, e meu remédio, era algo que ninguém ali conseguira me dar.

- que alegria! Encontrar vocês pra mim é a coisa mais preciosa neste mundo!

Sérgio nos abraça. Alice chora e ri ao mesmo tempo.


Le Cordier


Hoje queridas leitoras, em minha coluna MULHER, venho agradecer o apoio que todos têm me dado. E não só meus familiares, mas todos os amigos e meus amados leitores, dos quais tenho recebido cartas e e-mails de incentivo. Merci. E venho através desta publicação informar que minha cunhada e minha sobrinha estão de volta, assim como Rachel, a pequenina priminha de Caleb, meu filho. Estamos aguardando apenas o retorno de Claude, pai de Rach e filho do diplomata Henri Geraldy. Peço a ajuda de vocês mais uma vez, e conto com ela pois sei que é certa. Continuo a escrever e a pensar sobre a força que tem o amor e a esperança, além da fé. Sabendo que o amor é a maior e mais forte força que há, nos concentremos nele. Em amar a cada criatura deste mundo como a si próprio. Dando para receber e recebendo para de novo dar. Sem amontoar tesouros que a ferrugem corrói e que a traça consome. Vamos nos doar mais, vamos sorrir mais e chorar mais também! Fica a dica,
bisous a tout, pour tojours,

 Serafina Rosa Petroni,

editora chef da Le Cordier

Com um sorriso no rosto, eu abaixo a revista, e olho para minha família linda. Alice ainda está amuada, observando a aveia escorrer junto com o leite da colher repetidas vezes. Sérgio está estranho também, mas pelo menos come. Muito e muito rápido. Mas sei que é só um rastro deixado pelo impacto. Já passou. Agora torço pela Rosa. Torço pra que ela encontre o Claude. Que eles finalmente se entendam. Sei que é isso que está pra acontecer. Eu sei, eu sinto as coisas.E, assim como eu sabia que jamais daria certo com o Tony, desde o momento em que vi o Claude passando, lá na frente do restaurante do pai da Rosa, eu soube que é assim que terminaria: era perfeito. O Tony certamente não iria se opor, sei que no fundo ele queria isso. A Rosa não pareceu nem reparar na existência do Claude, mas eu vi que ele estava era louco por ela. Mesmo ele tendo aquela noiva -gótica e patricinha ao mesmo tempo- dele. Eu sei que o Caleb é a confirmação de que eu estou certa.



Rosa


-quê?!- engasgo. Janete se mantém firme. Sua aparência está voltando ao normal, aos poucos.

- ah eu estou cansada desse seu espanto ensaiado. Você sabe sim do que eu estou falando Rosa, não disfarça.

- sabe que eu não gosto deste tipo de conversa Jane... e não quero tocar no nome do Claude... a Rachel pode ouvir! Ela está tão triste...

- eu sei que a Rach sente muita falta dele... mas não desvia, eu estou falando de você...aliás, de vocês...

-Bah

- E, se você disse a verdade, vocês passaram um bom tempo grudados, procurando os “abduzidos” não foi?

-Ráaa engraçadinha, fala como se você não tivesse na parada. Mas então, você acha mesmo que pode ter havido clima em meio ao apocalipse? Janete!

- Mas é claro que acho! É em tempos de crise que as maiores e melhores revoluções acontecem! E já tava na hora! Vai ver tudo isso nada mais foi do que a resposta do universo à demora de vocês em admitir de que são perfeitos um pro outro! Sob medida! A resposta e solução de todos os problemas!

- Janete! Dio santo ! Como você é maluca! –rio, saudades disso- ah, que coisa, você não muda!

-E acha que isso seria possível? Ai sim você está equivocada! Mas eu tenho toda a razão, e no fim, você há de admitir!

-hum...- balanço a cabeça... espero que eu tenha a chance de escolher algo assim. -Que o Claude apareça e ai prometo que penso no assunto!

- Ih mas eu não seqüestrei ele não! Ou acha que sou a gênia da lâmpada?

- Da “lâmpida” como canta Adoniran Barbosa!

- Do que estão falando?- caleb chega acompanhado da sempre quieta Rachel, os dois sentam á mesa.

- ah de uma música antiga e engraçada.... quer café no leite?

- leite no café. Agora, conta, ou melhor, canta a música?

- ah de jeito nenhum!

- porrr favooor?- Alice chega e senta também, agarrando uma caneca que Janete enche de leite

- não me lembro muito bem.... mas é sobre mariposas.... ah, sim! “As mariposa...”- começo a cantarolar- quando chega o frio... “fica voando em vorta da lâmpida pra se esquentar... elas rroda, rroda rroda e depois se senta... em cima do prato da “lâmpida”, pra descançar...- sorrio

- nossa mas a letra tá toda errada mamãe!

- não está não Caleb... é que no Brasil, houve uma mistura de culturas, de línguas... e as pessoas mais pobres, mais humildes, principalmente na cidade de São Paulo, que não tinham muito estudo, muita educação, falavam assim, engoliam os “ésses”, erravam em concordância...
- e a maioria dessas pessoas, de São Paulo, são como nós, descendentes de italianos!

- eles falam como o vovô?

- mais ou menos... agora apressa! Apressa porque está na hora dos três irem à escola! Não podem perder o primeiro dia!

Rachel segue em silêncio. Sei que ela não quer ir, que está frágil de mais... mas nesse momento, sei que é um mal nescessário. Mais um na vida dela. sei que estar aqui comigo de certa forma também é... que ela sente falta de casa, da Dádi, de Marseile, do pai... Mas ela precisa se distrair. Precisa estar aqui...


Rachel

Na fabulosa Paris... onde tudo são cores... flores e cheiros. Entre todas as coisas, o que mais me impressiona em Paris são os parisienses. Parisienses tendem a ser impacientes, entediados e as vezes entediantes. Sou parisiense, eu sei. Mas não sei como, não sei se sou parte daqui. Enquanto caminho na rua, pulso por querer ser. Ainda mais quando no mercado, os vendedores sorriem e gritam: bon jour! É como se me dessem as boas vindas. Então me permito sorrir. Me permito esquecer tudo. Me permito esquecer do Carlo. Do Carlo. pai.... jamais. Já-mé. Ele não é e nunca será meu pai. Todas as coisas que ele disse... todas as coisas sobre eu ser igual a ele e ser parte dele.... não. Papai, eu quero esquecer... é tudo mentira... pai...

Sem perceber, me afasto dos outros. Corri à todo fôlego... de repente , um senhor meio alto, meio estranho na minha frente.

Papai... eu gosto de quando o senhor me abraça, de quando me põe nos ombros. Eu gosto de te atormentar as vezes, só pra ver o vinco que se faz na sua testa todas as vezes que você fica nervoso. Pai, se lembra daquele dia, que acampamos no quintal? Eu peguei cinco paus na sua carteira, ah, e minha carta não era aquela, mas juro que na próxima te deixo ganhar. Papa... eu não tenho medo de bicho papão, você sabe... mas ele não me deixa dormir... ele deve ter asma... respira muito forte... papai... acho que seria uma boa hora do senhor aparecer, como prometeu. Estou com medo agora, papa... espanta o bicho papão... lê um gibi pra eu dormir....







segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Capítulo 45- Conversas



Le Eternel Amour
Tulipe Rouge


...Devia ser mais divertido não devia?

- É...Vai ver é por que você não quer mesmo jogar.

- Isso nem é tão verdade assim.

- É só porque você não gosta de mim e foi obrigado a brincar comigo.

- Rachel?

-hum?

- Porque você fala português se o...seu pai é francês?

- Minha mãe era brasileira e minha babá também é. E tem meu avô e...

- Tá já entendi.

-....

- Que foi?

- Porque você e sua mãe falam português também sendo que são descendentes italianos?

- Ah é uma longa história. E chata também.

-Huh

- Você sente falta da sua mãe?

- É... as vezes... mas eu quase não sinto porque não conheci ela direito... Ela...morreu quando eu tinha uns quatro anos.

- Meu...pai...morreu antes de eu nascer.

- Eu lamento muito.

- É eu também...

- Escuta... e se agente fizesse um... esquema?

-Como assim esquema?

- Você queria ter um pai, eu queria ter uma mãe...

- E eu tenho mãe e você tem pai...

- Agente podia... Sei lá... fazer um... revesamento...

- sei não...

- Ah poxa como você é chato

- Ei! Você que é maluca...

- Não ri de mim!

- Mas você também está rindo!

- Não me enrola! Vai diz que aceita!

- Tá... supondo que eu aceite... Oque isso significa? Assinamos um contrato? Pacto de sangue?

- Báh, não... Agente aperta a mão.

-Ok... E agora?

-Agente precisa de um plano.

-Plano?

- É... Acho que...

- Que sorriso é esse?

-É que eu tive uma idéia! Agente precisa juntar os dois!

- Como assim Rachel?

- Ué... Agente precisa fazer os dois ficarem juntos... Como... Um casal.

- Como... Casal?

-É... Eles precisam se casar. Ai agente ia ter os dois ao mesmo tempo. A sua mãe ia ser minha mãe também...

 - E ... Espera... Teu pai mora em Marseille... Como agente faz?

- Ah sei lá... Agente pode... Passar um tempo morando lá e depois agente volta para cá pra Paris...

- Huh Paris é muito chata... Vamos todos pra Marseille que tem praia de verdade e ondas de verdade também.

- Ah eu gosto do Sena.

- Eu gosto do farol e do porto.

- Ah quer saber, montar outro grupo ia ser um trabalho muito duro...

- Que grupo?                

- Ei! Eu vi! Pode voltar uma casa seu sem vergonha!... E o MEU grupo...  cigales

- Ci oquê?

-Cigales. O nome de meu grupo...

- Fazem oque? Dançam Black? Balé?

- Ah eu odeio balé... Larguei e agora me dedico totalmente ao Blues e Jazz.

- Você gosta de Jazz?

- Oui! E olha... Sua rainha está em xequeee!!



“Engraçado... Eles... Conversam como se... Como se nada estivesse acontecendo. Como se nada fosse mais importante... Como se o Claude estivesse aqui... como se... Tudo estivesse bem.
Não parecem incomodados com a possibilidade de eu estar ouvindo a conversa, --e estou.

Não parecem dois órfãos unigênitos de famílias fracassadas. Mas dois... Irmãos. O que por pura ironia da vida não são.
Se pelo menos a Rachel fosse filha do Claude...
Se pelo menos Caleb não fosse filho do Claude... Seriam mais iguais... Ou... menos diferentes...

-Que droga!

-Mas...oque foi?- pergunto a Sérgio, que se desmonta no sofá a minha frente

- Nada é que... bom... estou feliz.

- Você está feliz? Mas...então porque essa cara?

- Acharam a Alice, Rosa!

- Deus do céu! Mas e onde? Como ela..está? Ela está bem?

- É...Ela foi localizada em Lille, não muito longe daqui. Mas...

- Onde está Janete? ham?- meus olhos se enchem de lágrimas

- Ela continua desaparecida e... a Alice está machucada.

-Como...machucada?

- O rosto dela... parece que... ela se feriu em arame farpado e cacos de vidro na fuga.

- Fuga? E de onde ela fugiu?

- Bem... parece que de uma espécie de orfanato clandestino... ainda não sei muito mas tem a ver com o tráfico de....

- Sérgio?- ele espreme os olhos e adormece


....

Voltamos de Lille com Alice dormindo e uma pilha de papéis sobre burocracias e processos jurídicos. E muitas Xerox da foto que Jane mais odiou entre todas as que ela tirou no verão passado... ela disse que aquelas foram as piores férias de todas também, porque não viajamos e ela ficou doente. Tinha pego catapora de um paciente muito bravinho...
Do Caleb. Foi muito engraçado.... E estou com saudades dela reclamar de não poder fazer as unhas com a mesma freqüência com que gostaria...

Alice vai ficar na minha casa também. No quarto de Caleb junto com Rachel. Caleb continuará comigo. A menos que queira a companhia de Sérgio. Ele anda tão solitário. Está afastado do trabalho por depressão e creio que não seria apropriado Alice ir pra casa por enquanto... ainda mais agora... ela precisará de colo de....

Sérgio

- Mãe?-Ela abre os olhinhos... sua cabeça em meu colo

- Oi amor...- Tento não parecer desesperado...Mas as lágrimas escorregam por minhas bochechas e uma até pinga na testa dela

- Papai?- ah como desejei ouvir esse chamado! Abraço-a com todo meu ser. Ela é parte de mim... e nunca mais vou deixá-la ir pra longe de meus olhos!

Alice passa a mão pelo próprio rosto e descobre as gazes... quero dizer...redescobre. Rosa já conversou com os médicos e parece que mais pra frente ela poderá remover as cicatrizes por cirurgia... o importante é que ela está bem... está aqui...

Somos fortes... e vamos conseguir juntar os cacos. E Jane está vindo eu sei. Esteja onde for... está a caminho. Está com saudades... Tanto quanto nós estamos.

-Você podia ao menos me dizer oque você pensa sobre mim, hã?

- Porque está perguntando isso Rosa?

- Porque... estou me sentindo estranha e... inútil.

- Ora mas oque é isso! Você está sendo maravilhosa! Como sempre foi mana!

- Grazie...Ma io so che que non è vero. Eu sinto.. sinto que eu poderia ter feito algo para que... Pra que as coisas fossem diferentes.. Olha só pra mim? A minha vida está toda louca... O pai do meu filho é irmão do homem que eu fiz o Caleb acreditar que fosse pai dele. Ele não sabia sequer da existência do Caleb... Nós nunca tivemos nada parecido com um romance e... Agora ele está desaparecido e eu sei que o inimigo dele... o mesmo farabuto que atirou no Tony... está lá... com ele nas mãos.

- Rosa... Você... por acaso sabe o porquê desse homem ai odiar tanto o Claude?

- Hm...

- Sabe?! Deus! E porque nunca contou pra ele? Ou pra... pra mim!?

- Sinto muito... mas foi um segredo que prometi guardar...

- Rosa...

- Eu sei que agora não faz mais sentido mas... eu prometi pro Tony...

- oque? Foi ele quem te contou?

- é...

ROSA

E do resto de nossa conversa daquele dia eu ainda me lembro... Ele olhou fundo nos meus olhos...

E num suspiro ainda disse:

- Tem certeza que quer saber?

Eu apenas assenti,sentido que com certeza em algum momento iria me arrepender.

- Ele é nosso irmão.

- Oquê?!- saltei do sofá

- É nosso meio-irmão na verdade...

- Tony... mas como assim? Ele é bastardo?

- Mais ou menos isso..

- Teu pai foi infiel a sua mãe?

- Non... O Carlos foi antes do meu pai casar...

- Mas como? Se ele..

-Rosa...

- Tá... pardon

- Ele conheceu a mãe do Carlos... Na mesma data que soube que ia se casar... Ele não conheceu minha mãe antes da véspera do casamento... Naquela noite ele foi à um bar... e lá conheceu uma cigana... filha do dono do lugar... foi ela quem atendeu ele no balcão. Ele disse que se apaixonou na mesma hora. E depois ele se casou... ele soube que a moça estava grávida... mas já era tarde. Ele ainda levou uma corça do meu avô... que pagou um dote à cigana... pra que ela fosse embora da cidade e jamais contasse nada a respeito da história... Meu avô era um homem severo... e não suportava a idéia de ter mais esse escândalo sujando o nome da família Geraldy...

- Nossa... Mas porque o Carlos...

- Carlo... Carlo na verdade... ele ... odiou mil vezes a família que o rejeitou... dizem que ele tem uma espécie de sociopatia... ele.. é doente. Sádico... Fazia coisas horríveis no quartel... isso o próprio Claude me contou...  Eu acho que o Carlos acha que nós somos os culpados por ele ter vivido uma vida miserável... e até... que somos responsáveis pelo assassinato de sua mãe.

- e..

-Sim, foi o meu avô o mandante desse crime. Eu li seu testamento... e suas horríveis confissões. O Claude acha que eu nãos sei de nada... que eu não entendo a raiva dele... Mas ele nem sabe dessa história e nem sabe que eu sei dos segredos sórdidos de nosso avô... que aliás, ele só suspeita.

- Mas Tony... como é que você consegue ser tão...

- Frio? Não Rosa... Não sou frio... Mas com tantos problemas... alguém tem que manter o controle não é? E mesmo que eu tenha de servir de mediador... no fim das contas... eu até prefiro ser. A última coisa que quero é ser um problema a mais.

- Você nunca será Jean...- o olho intensamente. Eu sabia que jamais esqueceria dele. E não esquecerei mesmo que queira.



sábado, 30 de julho de 2011

Ponto de encontro




Crônicas de U.R.C.A

Ele passava na rua... ela olhava as manchetes na banca. Ele se cansou dos cigarros, e jogou o maço inteiro no latão de lixo. Eles nunca ajudaram nem fizeram diferença. Já que ele mesmo nunca os experimentou por mais de cinco segundos. 
Estava ventando, mas não estava mais frio externamente do que internamente, para eles. Se o corpo é a casa da alma, que casa mais gelada eles foram arranjar!

 Ela sorriu para a senhora que disse um “Deus abençoe” pelo jornal que ela comprou. Ele espraguejou pela poça de lama que pisou.

Mas em tantas diferenças eles eram tão iguais! Podia parecer que não tinham nada em comum e que jamais se conheceriam. Não havia porquê se conhecerem. Mas talvez o tédio, ou a demora do ônibus... Algo talvez aconteceu. E talvez eles encontraram os olhares. E talvez eles começaram um jogo silencioso. E talvez eles sorriram de um menino e seu cachorro espertinho, que aproveitou a distração que o dono oferecia ao moço da barraca de cachorro-quente para derrubar, num golpe de focinho, uma lata cheia de salsichas.

Talvez eles se sentiram iguais naquele instante. Por se divertirem duma mesma cena. Por acompanharem a corrida do cachorro fugindo com os olhos. Mas como, como que o cão viu apenas aquela direção, como ele atravessou a rua e insanamente tentou passar pelo meio dos dois sem quase derrubar ambos?

Ela se desequilibrou, porque a fita do cão se enrolou em suas pernas, como num laço de caçada. Ela se inclinou para a frente e quase caiu sobre ele.
Ele a segurou pelos braços, e depois que ela se estabilizou sobre os pés novamente, ele soltou o cãozinho que ensaiava um pedido por piedade com seu choro. Eles riam alto, e depois que o menino virou a esquina, eles se deram conta de que não iria ser sempre assim. Que eles não olhariam sempre para a mesma direção. Ou não?

Nesse momento, espremeram os olhos, e se encararam com a mesma expressão de dúvida e como se seus lábios imóveis pudessem fazer questionamento. Mas não. Se olharam e de novo constataram que pela razão não haveria o porque de eles olharem para a mesma direção de novo.

..
Ela saltou do ônibus, ele ficou lá no último banco se perguntando “porquê ela sentou no primeiro?” A distância da ignorância os separava. Mas agora não mais tão distante eram, porque já não ignoravam a existência um do outro.
Ela agora sabia que aquele moço saltaria em algum ponto mais à diante. Talvez mais, talvez menos distante que o ponto final da cidade. Onde ele iria? Porque ela não poderia ir junto onde quer que fosse? Isso era tão irreal quanto o que a fazia pensar que jamais o veria novamente.
A sutil esperança. Aquela que ninguém pede para ter. ela vem como a fé. Você acredita, ou não. Não tem explicação, e é inquestionável. Ele sentia essa esperança. A de que encontraria a moça de novo. Ele sabia que a encontraria!
Como? Ah, a esperança maluca é que sabe.

Num dia não mais quente e nem muito diferente do cinza daquele outro eles se viram de longe. Se reconheceram!
Desespero sem causa aparente, como se uma porta fosse fechar e veja... ela se fechou. Ele não conseguiu entrar no ônibus. Ela apenas ouviu o murro que ele deu na lataria pouco antes do ônibus o deixar para trás. Ah não. Ela fechou os olhos e suspirou. Ele bufou pelo infortúnio. Mas uma vez, algo estava acontecendo silenciosamente.

Aquele desencontro só instigou ainda mais a imaginação dela.
Ele sentia que sua vida poderia mudar a qualquer momento.
Ela sabia que era louca por acreditar em contos de fadas.
Ele batia nas teclas com precisão e pouco mais de força que o necessário.
Onde estaria um em relação ao outro? Para resolver este caso, os cálculos dele não eram o suficiente. Para ela, desenhar algo que esboçasse seus pensamentos era um absurdo!

Ele e seus cálculos sentado junto à janela. O ônibus lotando aos poucos. Ela sobe a bordo com os olhos vidrados em psicologias que seu livro lhe ensinava.
Distração que veio mostrar, que certas coisas simplesmente acontecem. Sem mais.

Ela sentou e ele nem mesmo olhou quem estava a seu lado. Na verdade, ela também não o reconheceu. Ela sequer reparou no moço de cabeça baixa a seu lado.

“-Ei, com licença!” – poderia ser quem?... a voz do óbvio talvez... mas era uma moça estendendo um buquê de rosas vermelhas, cada flor com um laço em seu caule. O cheiro das rosas era notável... e os dois pares de olhos pousaram sobre elas. Ele enfim notou os cabelos dela. As mãos prendendo o livro, o pescoço comprido e delicado. Ele só podia sorrir.
Ela olhava ainda desvairada para a moça das flores, que sorria e pedia a contribuição que lhe cabia. Uma mão irrompeu o campo de visão dela, e a moça das flores recebeu a nota que ela lhe oferecia, e em seguida entregou uma das suas cheirosas rosas para a ‘mão misteriosa’.
Ela não queria, era um tanto constrangedor. Mas o impulso girou sua cabeça na direção do dono da rosa. E ela até se assustou um pouco, quando viu um largo sorriso se formar no rosto dele e olhos brilhantes faiscando um milhão de palavras à ela.
Ela sorriu também, e recebeu a rosa.

Naquele dia ela conheceu o estudante que lidava habilmente com os números e fazia cálculos complexos, mas sempre agia pela emoção. E naquele dia ele se surpreendeu com a quase psicóloga que não conseguia deixar a razão. Ambos descobriram que em tudo eram diferentes, que em nada eram parecidos. E isso era perfeito! Era perfeito porque um poderia ter no outro aquilo que não encontravam em si mesmos. Mais do que se completarem, eles faziam parte um do outro sem saber.

“-Meu nome é Rosa.”
“Je m’appelle Claude”

Eles sorriram. E desta vez, um para o outro.








segunda-feira, 25 de julho de 2011

Capitulo 44- Pourquoi la nuit est noire?


Le Eternel Amour
Tulipe Rouge



Dis-moi dis papa, Pourquoi le ciel est bleu
Dis-moi dis papa, Qui l'a rendu si bleu....

C'est un petit garçon, Qui a perdu son ballon, Un gros ballon bleu, Qui est monté jusqu'aux cieux...
Et voilà pourquoi depuis le ciel est bleu...
Et voilà pourquoi depuis le ciel est bleu...


Ah mas porque mãe? Nossa isso é muito chato!

- Caleb!- o olho intensamente, com cara de brava e irreverente. Ele arqueia a sombracelha, e vai em direção ao meu quarto. Engraçado, quando ele era menor, dormir no meu quarto era algo bom, para ele. Ele gostava. Na verdade, sei que ainda é. Mas ele quer marcar território. Ele está morrendo de ciúmes da Raquel. Eu sei que está. É muito engraçado isso...

...Dis-moi dis papa, Pourquoi la nuit est noire.
Dis-moi dis papa, Qui l'a rendue si noire
...C'est monsieur le soleil...Qui a souvent sommeil, Quand il va faire dodo...Il tire ses rideau. ...Et voilà pourquoi pourquoi la nuit est noire...
Et voilà pourquoi pourquoi la nuit est noire...

Ela assim nem parece ser tão hiperativa quanto o Claude disse... Dormindo... os olhos verdes escondidos sob as pálpebras tão cansadinhas... Hoje foi com certeza um dia bastante cansativo. Sim... uma semana tensa para todos nós.

-Espero que seu pai esteja bem, anjinho. Espero que o Claude esteja bem. Sei que ele nunca
vai te deixar.

Beijo a testa dela, e saio, deixando a porta entreaberta. Não sei... Mas acho que visto os traumas recentes, ela pode ter pesadelos.
Chego ao meu quarto finalmente, Caleb sentado na cabeceira, olhos atônitos. Eu dou um sorriso cansado

-Você não pode ficar com ciúmes filho, ela precisa de nós agora!

- É... eu sei mamãe, me desculpe, tá? Mas... eu acho estranho, você ficar mimando ela assim...

-Amor... ela está frágil. E além do mais, você sabe, ela não tem uma mãe pra amparar ela agora, ela precisa de mim!

- Ah mais eu também não tenho pai e não tem ninguém aqui pra me amparar por isso!

- Caleb! Olha pra mim?

- hm?

-Não diz isso, hã?

-Mãe olha só como são as coisas: na minha vida como a senhora sabe, a coisa que eu mais queria era ter meu pai. Ter ele junto de mim, aqui, presente.

-Você sabe que isso não foi possível.

- É. Não foi. Mesmo quando ele estava assim mais perto do que eu podia imaginar. Sabia de mim?

-Caleb do que você está falando filho?

- Do que? Mãe eu não sou mais um bebezinho não!

- Ah é sim. Agora, chega desse papo brabo, amanhã agente conversa, sim? Eu estou nocauteada!

-Hunf,

-Bonne nuit, mon petit garçon.

====

-é que ele me assusta as vezes, Sérgio!

- ah, mana, ele já tem dez anos, e é esperto que só.

- Tá...eu sei que devia estar mais preparada mas ouvir ele falar assim que nem adulto é muito chocante!

-Ai ai... vou começar a cobrar pela terapia, ein?

-Engraçadinho... mas você sabe, eu não tenho a mínima noção de como explicar pra ele que...

-...

-Espera... Sérgio... que cara é essa? Hm... oque...?

- Tá. Podia ser mais difícil então encare com firmeza, hã? O Caleb já sabe que o pai dele é o Claude.

-Oque? Você...?!

- Não. Não fui eu quem contou. Foi o avô dele.

- Oque?!

-É... o doutor Henry assim que acordou, quis falar com o Caleb.. eles tiveram uma longa conversa, a qual eu não ouvi né. Mais o fato é que o doutor Geraldy me informou, logo depois que o Caleb saiu correndo do quarto, que ele havia dito a verdade pro neto.

- Meu Deus....


- Mas está tudo bem já Rosa. O Caleb sabe em quais circunstancias ele foi concebido e porquê. Mas ele ainda não absorveu tudo. Você sabe o quanto foi difícil crescer sem a figura de um pai.

-É... eu sei sim.

- E agora que ele sabe que o Claude já sabia, e que mesmo assim não esteve presente...

- Ele sabe que eu...

- É. Ele sabe que o Claude não esteve presente porque você não permitiu. Mas pensa que ele deveria ter insistido e lutado por ele. E acha que ele não o fez por causa...

- Da Rachel. Ele deve achar que o Claude não queria ele porque já tinha a Rachel.

-Sabemos que isso em partes é verdade, porque se o Claude não tivesse Rachel, talvez ele se irasse mesmo, rodasse a baiana e viesse com tudo lutar pela guarda do Caleb... Mas em partes também porque ele simplesmente não queria mais sofrimentos. Já que tudo se baseava na vida e obra de Jean Antoine Geraldy e que você já havia passado por muita coisa....

-Ele sabia que tudo ficaria bem...- concordo cabisbaixa

- Ei... não fica assim. O Caleb te ama. Ele vai te entender. Sei que ele já te perdoou. Você conhece a tua cria não é? Ele só está meio incomodado e enciumado pela presença da filha do Claude, que por sinal, ele pensa que roubou o lugar dele no coração do pai.

-É. Você tem razão... mas é que eu não gosto nada disto...

-É...Compreendo...

-Ei...não fica assim você também, mano! Estou aqui com você, hã? Elas já aparecem!

Sérgio balança a cabeça

- Eu peço desculpas por encher ainda mais a sua vida com meus problemas...

-Não... estamos juntos nessa, não é?

- É. Você tem razão. Vamos vencer tudo isso juntos, eu sei!

Sorrimos em cumplicidade. Não um sorriso alegre em efetivo, mas um sorriso de esperança e certo otimismo  porque, afinal, estávamos juntos!















quinta-feira, 14 de julho de 2011

Capitulo 43- Fora do ar





Le Eternel Amour
Tulipe Rouge




“...Eu fugi na noite passada....
Me peguei longe de uma visão e um lugar que eu conheço.
Totalmente esmagado sobre minha pele
Essa confusão que eu coloquei você e o soco que te dei...
Foi  uma reação estranha
Alguém como você continuar do lado
E, em uma reação em cadeia
Eu estava pra baixo pedindo por um lugar para me esconder....”

Quando os seus olhos estão abertos, e mesmo assim você não enxerga.

Ah...Calleb....

Quando os seus olhos estão vidrados e mesmo sem piscar, você ainda não vê nada, e não há nada a perder...
Rachel...

Quando você procura num lugar onde não há nada... Quando você não sabe onde procurar...
Rosa....

O dia em que tudo se perdeu... Não... O dia em que eu perdi tudo...
>>>> 
-Tritec !!!!

Tento abrir os olhos...

- Tritec !!!

Dói... tudo em mim dói

- Traaaaa....- parece...som de... alguma espécie de “trilho”...metal...

-bunp!

Finalmente abri os olhos, eu sei que abri! Mas... a ausência de luz me emerge na escuridão... Frio... muito frio.
Tento me levantar, mas acabo engatinhando. Me sentindo cego... estou, ao que parece, num camburão. E o veículo não está deveras devagar. Mas sei que existe algum fator natural que o impeça de "voar" na pista... como...
- Neve? -  tento adivinhar oque toco na fenda da porta... e acertei, sem dúvidas é neve. Onde estarei?

Rosa
  

“Eu vi um braço quebrado
Máquinas irão quebrar, todas da forma que eu sei
Todas remendadas e limpas.
Vi na tela todas as pedras que eu joguei...”

Hm...
 Estou... fora do ar...

Vem uma vozinha... um tanto rouca e fina ao mesmo tempo... como uma brisa que corre pela rua... e aí, faz as vidraças zumbirem...
Fraqueza e fortaleza... rimam... mas não necessariamente  parecidas... são... antônimas... são... antagônicas uma da outra...

-Psiiiiu... – um assovio fino... languido – Psiiiiuu... olha... olha aqui... pra mim... abre os olhos!

E ai tomo a consciência de novo. Sinto o meu corpo... estranhamente. É tão apavorante e ao mesmo tempo maravilhoso viver... sentir suas costas... sua própria pele... perceber que seu pulmão respira... que seu coração trabalhou mesmo quando você esteve de alguma forma ausente...

Como acordar de manhã depois de passar a noite chorando... aquela sensação: estou perdido no mundo... mais veja! Há esperança!



Uma luz que me desnorteia e sensibiliza os olhos... não... não é o fim do túnel... é a lâmpada de uma lanterninha... alguém me sustenta o queixo, me olha indiferente e atento ao mesmo tempo... Quando você não é alguém... você é só... Mais um. Ser que pensa e respira mesmo assim...

Me percebo no corredor de um hospital... sentada numa cadeira pouco cômoda... pessoas passando sem parar, e mesmo assim essa moça me olha intensamente... diz palavras em um idioma que não compreendo. E faz frio... verão e está muito frio aqui.... Fecho os olhos querendo me virar, como se estivesse procurando a posição perfeita em minha cama- como se eu estivesse me casa! 
... mas a moça nem parece ter se incomodado, ela puxa minha pálpebra, diz mais alguma coisa e acena pra que uma outra moça se aproximasse.

A mulher fala num inglês carregado de sotaque soviético – ao qual tive contato muitos anos atrás, quando visitei Jane na Rússia- 
Ela me informa de que eu estava em Minsk, que eram dez horas da manhã e que a minha filha estava sem documentos. Se eu sabia explicar porque ela estava abordo sem identificação... qual era minha nacionalidade, oque eu estava pretendendo fazer em Belarus e quanto tempo eu pretendia ficar.
Muitas perguntas. Sem respostas.

 Aliás, respostas tinham, mas não tinha estado de espírito pra isso. Principalmente quando você sabe que ela já sabe. Só está te testando. Quer saber se você está... em alguma falcatrua. Sei lá...
Respondi não com palavras, mas com números. E em francês, foi meio automático. Eles vieram na minha mente como se eu estivesse no balcão da locadora, ou...
como se estivesse de frente pra recepcionista da clínica pediátrica... qualquer coisa, liga nesse número... ow... meu Deus...

Ela fica estática me olhando... depois pergunta: vous êtes français?
Eu balanço a cabeça, e não consigo ver mais nada....


Sérgio

Duas quadras, amigo, duas quadras! Vaaaamos!

- Ah tio, meus tornozelos, as solas dos meus pés!

- Que isso Caleb, você mesmo é quem estava me dizendo que eu não era de nada, e blá blá blá... Cadê? A sua força? Ein?

Rodeio o pequenino, a testa de ambos suada e as camisas grudadas no corpo.

- Tinha que ser por essa rua? E todas as ladeiras? As escadas?!

- Ah agente precisa mesmo melhorar a forma... que isso... Não podemos admitir que num dia como esse, tão raro aqui em Paris, com esse sol e o calor, agente perca a oportunidade de andar por ai por falta de coragem!

- Quê? Falta de coragem? Ih agora cê vai ver!

- Ei ei ei rapazinho! Caleb! Ei!

Droga!

Caleb caiu e esfolou toda a perna, o joelho ficou roxo e uma luxação no braço.
Tudo porque agente queria se libertar e correr. Tudo porque eu fui um imprestável que não soube lidar com uma criança e escolhi a pior ladeira pra fazê-lo subir correndo.

Eram só dois quarteirões!


- Alô, bonjour.... Mais Quoi???

Rosa estava perdida e sozinha em outro país... e um daqueles que eu nem sequer sonhei em conhecer... nos confins.. quase que em outro continente...  e lá estava ela... e ... Rachel.

Quando a mulher do outro lado da linha disse que havia uma garotinha, meu coração pulou, mas quando ela disse o nome pelo qual esta respondia... eu respirei fundo, e tentei não chorar. Foi um segundo negro... aquele em que uma montanha é tirada de meu coração e depois posta de volta, e aí, parecendo ainda mais pesada...

Tipóia pro Caleb, ligações pra consulados e visitas a consulados e embaixada e blá blá blá..  Bem que o avô do Caleb podia estar na ativa agora... seria muito mais rápido...


Em dois dias, a Rosa estaria aqui... com a Rachel.


Rosa

Demorou alguns segundos pra eu me ligar... pra cair a ficha de que... minha filha? Pera ai.... a
- Rachel?- chamo, e ela imediatamente me olha com aqueles olhos de pires, e percebo que ela segura firme em meu braço. Está a meu lado no banco

- Sallut...

- Você está bem? Alguém te... te machucou?

- “um-um”... – ela balançou a cabeça- Cadê meu pai?

- O seu pai... – pensei em usar de metonímia com ela mas desisti por razões obvias, eu não poderia manter mentiras nessas circunstâncias- eu também não sei... – arfei- eu... eu estava com ele... estávamos atrás de vocês e ... Rachel, onde está a Janete e a Alice você sabe?

- Não... você diz... a Lili e a mãe dela né?

- é... – suspirei, sabendo que ela não poderia ajudar muito

- Agente se viu... estávamos de carro... a noite... e depois... depois elas foram pra outro lugar... e eu dormi.

- Como assim meu anjo?

- agente estava num carro... depois o carro parou e apareceu um moço, que fez gesto pra elas ficarem caladas... a tia Janete soltou um grunido alto... ela tava nervosa e chorando muito... ai o moço bateu no rosto dela... eu e a Lilli começamos a gritar socorro mais ai o moço ficou ainda mais nervoso e me trancou de volta no carro e levou elas pro outro carro, pra outro moço... ai eu não vi mais elas...

- ele tem um comparsa... sabia que tinha!

- Mas pra que isso tia? Por que levaram elas se ele só queria que meu pai pagasse pra ele?

- oque?

- é...o moço disse que meu papai querido estava devendo ele... e que ele ia ter que pagar...eu disse pra ele que eu falaria com o meu pai... que com certeza ele ia pagar tudo... que ele podia me soltar... mas ele disse que eu iria pra casa logo, se tudo desse certo...

- é mesmo?

- é... ele disse que só queria....


Sergio

- O Claude... era tudo um plano maluco Sérgio...

- Meu Deus Bel... Ele estava só... brincando com agente? Imbecil sádico! Quem ele pensa que é? Onde está minha filha e minha mulher?!

- eu não sei Sérgio... eu não sei... ele pode ter passado elas pra algum... outro maluco ou sei lá... a Rachel disse que ele as separou... separou ela da Jane e da Alice... que elas foram pra outro lado....

- De Marsele elas foram pra onde? Deus elas podem estar em qualquer lugar! Se elas saíram pelo porto... elas podem estar na Itália ou.. podem ter sido levadas pra Romênia... Amsterdam...

- Calma Sérgio... na verdade... eu acho que daqui a pouco elas aparecem...afinal... como eu disse... foi tudo uma tortura psicológica  e  ato passional... ele já tem que ele queria... o Claude....



“...Foi uma reação estranha
Alguém como você se manter tão decidida
E, em uma reação em cadeia
Eu
 me desmancho e me quebro e depois rastejo para long
e...”


(trechos da música You Love means everything, Coldplay)