Le Eternel Amour
Tulipe Rouge
Cobri
todos os espelhos com lençóis brancos, para que Alice não fique ainda mais
triste. Tão calada tão... frágil... espero que fique boa logo... espero ouvir
risos e vozes de crianças brincado... Porque tudo oque tenho visto neles é uma
estranha maturidade... uma maturidade que veio de sofrer eu sei... Mas não
quero isso. Não aceito... pois tudo oque eles têm tido são conversas... Olhos
um tanto pensativos, distraídos, até.... Mas firmes... sem choro algum.
-
Recebi uma ligação da Rússia...
-
Mesmo? e... de quem?
-
Dun... aquele meu amigo lembra?
-
Ah... o do cabelo enrrolado...
-É...
ele me deu uma excelente notícia!
-mesmo?
-hunhum
-
e não vai me contar?
-
Sei não... acho melhor fazer surpresa!
Rachel
-Dáaadi!
-Olá
meu amor... mas que saudade!
-
Dádi... Cadê meu pai?
-
Não se preocupe... que logo ele aparece!
Esta
era uma conversa de quase todos os dias... depois da escola.
Papai
não chegava às cinco como eu... mas sim às seis. E essa hora eu aproveitava pra
ficar no quarto dele, ouvindo músicas e vendo os álbuns de família que ele
escondia de mim.
Meu
tio Jean... parece tão gentil...tão convidativo... só de olhar dá vontade de
contar um segredo pra ele. Ele parece
ser compreensivo... mas não compreendido...
De
qualquer forma... sei que não vou poder confiar nada à ele. Ele não está aqui
pra me ouvir. Mas papai agora também não.
Queria
ter conhecido o tio Jean... ele se parece muito com meu papai...
Queria
que estivesse aqui... Pra poder dizer que eu sinto falta do papai. Que queria
que a Rosa fosse minha mãe... Que estou com medo... que sinto um frio na
espinha...
Chegou
uma moça na casa... a mãe da menina de rosto cortado... Ela parece tão
infeliz... mas porque? Se tem o pai e a mãe dela pertinho dela? Todos os dias?
As
minhas amigas também eram assim... Difíceis de se satisfazer... Queriam sapatos
novos... novos celulares... Festas e presentes caros... As vezes eu ficava
triste por não ter tudo como elas... mas agora eu sei... eu sempre tive TUDO.
E meu pai certamente é meu bem maior.
Rosa
Papai... eu sempre soube, na verdade. Eu
sempre soube, alguma parte de mim tinha toda a certeza. Eu sinto muito papai.
Não consigo ficar triste de saber que ele está vivo. Isso é estranho o suficiente
pra eu não querer mudar nada. Nem meus conceitos. Papai, eu aprendi, ouvindo as
musicas que você ouvia, lendo os livros que você leu... Acredito que eu sei, tudo oque em tese, você
teria me dito. Eu não me importo, se eles acham que sou estranho. Não me
importo se dizem que sou um nerd órfão. Não me importo da Rachel existir, não
mais. Na verdade, nem sei do que eu estou falando. Mas gostaria de ouvir sua
risada, a mamãe diz que era a coisa mais maravilhosa de ouvir. E que quando
você ria, todo mundo ria também. Estou aqui, escrevendo no seu caderno, em sua
memória e homenagem. Que o Claude esteja bem, papai, cuide dele. Que ele possa
ser quem o senhor tanto sonhou que ele fosse. E no momento, o mais importante:
que ele seja um super herói. Que ele faça jus ao fardo que lhe foi dado. Aquele
homem é meu pai, e espero que ele queira a mim como filho. Sempre vou te amar
papai, e vou te enxergar nele, eu prometo. E que ele te enxergue em mim também!
Não sei se choro, se rio, se me debato. Oque
sentir nessa hora? O Caleb saiu correndo e fechou o caderno, mas eu abri na
página certa, mas talvez na hora errada. Acredito que não estou preparada para
saber o que o meu filho está sentindo agora. Nem mesmo para suportar aquilo que
eu sinto. O meu amor, o Jean, se estivesse aqui, me sustentaria. Mas como ele
não está, me sustento nele mesmo assim. Em saber que ele me diria que tudo
ficará bem, eu fecho os olhos e penso nele, e no suporte que ele sempre foi pra
mim.
Nos
dias de crise, ele me fazia rir. Sim, e só ele conseguia! Se o Tony estivesse
aqui, ele me diria para esquecê-lo. Para esquecê-lo e seguir em frente.
Mas
nisso ele está errado. É exatamente pela vida dele, e pelo que oque significou
na minha vida, que eu vou conseguir. Vou ser forte, e vou seguir em frente. E tomei uma
decisão. Se o Claude realmente quiser, ele será o pai do Caleb. E seja oque Deus quiser!
Janete
Eu
me sinto esquisita, e parece que acabei de acordar na banheira. O vapor no
espelho, os frascos na penteadeira. Tudo como sempre, como se fosse mais uma
manhã entre todas. Tudo oque consigo pensar, é no meu marido, em minha filha.
Nos olhos deles brilhando e em seus
sorrisos abertos me recebendo num abraço. A minha cabeça ainda está confusa,
mais oque sei é que tive sorte, não morri, eu prevaleci. Eles cortaram meu
cabelo, e depois me jogaram numa rua lamacenta, num país desconhecido. Só Deus
sabe como cheguei a Moscou, e encotrei Dun. Ele quase não me reconheceu, eu
estava suja, com cobertores nas costas, e falava arfando, por causa duma bruta
pneumonia que contrai. O resto, foi hospital, soro e muita dor. A ironia é que
o lugar que antes era pra mim entre todos o que me causava mais entusiasmo e
energia, desta vez pareceu sugar toda minha fé. Parecia que eu jamais sairia de
lá. Como alguns dos meus primeiros pacientes, no começo de tudo. Mas agora, eu
era a doente, e meu remédio, era algo que ninguém ali conseguira me dar.
-
que alegria! Encontrar vocês pra mim é a coisa mais preciosa neste mundo!
Sérgio
nos abraça. Alice chora e ri ao mesmo tempo.
Le Cordier
Hoje queridas
leitoras, em minha coluna MULHER, venho agradecer o apoio que todos têm me
dado. E não só meus familiares, mas todos os amigos e meus amados leitores, dos
quais tenho recebido cartas e e-mails de incentivo. Merci. E venho através
desta publicação informar que minha cunhada e minha sobrinha estão de volta,
assim como Rachel, a pequenina priminha de Caleb, meu filho. Estamos aguardando
apenas o retorno de Claude, pai de Rach e filho do diplomata Henri Geraldy.
Peço a ajuda de vocês mais uma vez, e conto com ela pois sei que é certa.
Continuo a escrever e a pensar sobre a força que tem o amor e a esperança, além
da fé. Sabendo que o amor é a maior e mais forte força que há, nos concentremos
nele. Em amar a cada criatura deste mundo como a si próprio. Dando para receber
e recebendo para de novo dar. Sem amontoar tesouros que a ferrugem corrói e que
a traça consome. Vamos nos doar mais, vamos sorrir mais e chorar mais também!
Fica a dica,
bisous a tout,
pour tojours,
Serafina Rosa Petroni,
editora chef
da Le Cordier
Com
um sorriso no rosto, eu abaixo a revista, e olho para minha família linda. Alice
ainda está amuada, observando a aveia escorrer junto com o leite da colher
repetidas vezes. Sérgio está estranho também, mas pelo menos come. Muito e
muito rápido. Mas sei que é só um rastro deixado pelo impacto. Já passou. Agora
torço pela Rosa. Torço pra que ela encontre o Claude. Que eles finalmente se
entendam. Sei que é isso que está pra acontecer. Eu sei, eu sinto as coisas.E,
assim como eu sabia que jamais daria certo com o Tony, desde o momento em que
vi o Claude passando, lá na frente do restaurante do pai da Rosa, eu soube que é
assim que terminaria: era perfeito. O Tony certamente não iria se opor, sei que
no fundo ele queria isso. A Rosa não pareceu nem reparar na existência do
Claude, mas eu vi que ele estava era louco por ela. Mesmo ele tendo aquela
noiva -gótica e patricinha ao mesmo tempo- dele. Eu sei que o Caleb é a
confirmação de que eu estou certa.
Rosa
-quê?!-
engasgo. Janete se mantém firme. Sua aparência está voltando ao normal, aos
poucos.
-
ah eu estou cansada desse seu espanto ensaiado. Você sabe sim do que eu estou
falando Rosa, não disfarça.
-
sabe que eu não gosto deste tipo de conversa Jane... e não quero tocar no nome
do Claude... a Rachel pode ouvir! Ela está tão triste...
-
eu sei que a Rach sente muita falta dele... mas não desvia, eu estou falando de
você...aliás, de vocês...
-Bah
-
E, se você disse a verdade, vocês passaram um bom tempo grudados, procurando os
“abduzidos” não foi?
-Ráaa
engraçadinha, fala como se você não tivesse na parada. Mas então, você acha
mesmo que pode ter havido clima em meio ao apocalipse? Janete!
-
Mas é claro que acho! É em tempos de crise que as maiores e melhores revoluções
acontecem! E já tava na hora! Vai ver tudo isso nada mais foi do que a resposta
do universo à demora de vocês em admitir de que são perfeitos um pro outro! Sob
medida! A resposta e solução de todos os problemas!
-
Janete! Dio santo ! Como você é maluca! –rio, saudades disso- ah, que coisa,
você não muda!
-E
acha que isso seria possível? Ai sim você está equivocada! Mas eu tenho toda a
razão, e no fim, você há de admitir!
-hum...-
balanço a cabeça... espero que eu tenha a chance de escolher algo assim. -Que o
Claude apareça e ai prometo que penso no assunto!
-
Ih mas eu não seqüestrei ele não! Ou acha que sou a gênia da lâmpada?
-
Da “lâmpida” como canta Adoniran Barbosa!
-
Do que estão falando?- caleb chega acompanhado da sempre quieta Rachel, os dois
sentam á mesa.
-
ah de uma música antiga e engraçada.... quer café no leite?
-
leite no café. Agora, conta, ou melhor, canta a música?
-
ah de jeito nenhum!
-
porrr favooor?- Alice chega e senta também, agarrando uma caneca que Janete
enche de leite
-
não me lembro muito bem.... mas é sobre mariposas.... ah, sim! “As mariposa...”-
começo a cantarolar- quando chega o frio... “fica voando em vorta da lâmpida
pra se esquentar... elas rroda, rroda rroda e depois se senta... em cima do
prato da “lâmpida”, pra descançar...- sorrio
-
nossa mas a letra tá toda errada mamãe!
-
não está não Caleb... é que no Brasil, houve uma mistura de culturas, de línguas...
e as pessoas mais pobres, mais humildes, principalmente na cidade de São Paulo,
que não tinham muito estudo, muita educação, falavam assim, engoliam os “ésses”,
erravam em concordância...
-
e a maioria dessas pessoas, de São Paulo, são como nós, descendentes de
italianos!
-
eles falam como o vovô?
-
mais ou menos... agora apressa! Apressa porque está na hora dos três irem à
escola! Não podem perder o primeiro dia!
Rachel
segue em silêncio. Sei
que ela não quer ir, que está frágil de mais... mas nesse momento, sei que é um
mal nescessário. Mais um na vida dela. sei que estar aqui comigo de certa forma
também é... que ela sente falta de casa, da Dádi, de Marseile, do pai... Mas
ela precisa se distrair. Precisa estar aqui...
Rachel
Na
fabulosa Paris... onde tudo são cores... flores e cheiros. Entre todas as
coisas, o que mais me impressiona em Paris são os parisienses. Parisienses
tendem a ser impacientes, entediados e as vezes entediantes. Sou parisiense, eu
sei. Mas não sei como, não sei se sou parte daqui. Enquanto caminho na rua,
pulso por querer ser. Ainda mais quando no mercado, os vendedores sorriem e
gritam: bon jour! É como se me dessem as boas vindas. Então me permito sorrir. Me
permito esquecer tudo. Me permito esquecer do Carlo. Do Carlo. pai.... jamais. Já-mé.
Ele não é e nunca será meu pai. Todas as coisas que ele disse... todas as
coisas sobre eu ser igual a ele e ser parte dele.... não. Papai, eu quero
esquecer... é tudo mentira... pai...
Sem
perceber, me afasto dos outros. Corri à todo fôlego... de repente , um senhor meio
alto, meio estranho na minha frente.
Papai...
eu gosto de quando o senhor me abraça, de quando me põe nos ombros. Eu gosto de
te atormentar as vezes, só pra ver o vinco que se faz na sua testa todas as
vezes que você fica nervoso. Pai, se lembra daquele dia, que acampamos no
quintal? Eu peguei cinco paus na sua carteira, ah, e minha carta não era
aquela, mas juro que na próxima te deixo ganhar. Papa... eu não tenho medo de
bicho papão, você sabe... mas ele não me deixa dormir... ele deve ter asma... respira
muito forte... papai... acho que seria uma boa hora do senhor aparecer, como
prometeu. Estou com medo agora, papa... espanta o bicho papão... lê um gibi pra
eu dormir....